- Detalhes
Um tributo ao eterno “rapaz latinoamericano”
O nome de Belchior ganharia grande notoriedade com o lançamento de Falso Brilhante, em 1976, disco antológico da cantora em que ela interpretava, de forma visceral, “Velha Roupa Colorida” e “Como Nossos Pais”. O álbum Alucinação, lançado por ele no mesmo ano, ainda ecoa várias canções por rádios, TVs, shows e regravações em todas as partes do Brasil.
Observador do seu tempo, ele soube captar as nossas inquietações e as lapidou em letras com forte carga política e social, sem abrir mão da sensibilidade. Suas canções, assimiladas principalmente pela juventude dos anos 1970, inspiraram reflexões e foram reconhecidas como símbolo de engajamento de toda uma geração que lutava contra a ditadura militar e pela redemocratização do país.
Tributo a Belchior: show inédito com as participações de Ana Cañas, Karina Buhr e Taciana Barros tendo uma banda base com guitarras, violões de aço e nylon. Foto: Edison Ferreira.
Além do diálogo com a tradição literária, Belchior também foi um dos compositores que mais se propuseram a travar, dentro das canções, embates com outros criadores e artistas. Caetano Veloso, por exemplo, foi um dos alvos de seu olhar contestador. “Mas sei que nada é divino, nada, nada é maravilhoso. Nada, nada é sagrado, nada, nada é misterioso, não”, canta o cearense em Rapaz latino-americano em uma referência clara a Divino maravilhoso, de Caetano.
O tributo

Os arranjos potencializaram a face poética, filosófica e musical do genial e fundamental artista. Intercalando com quatro pequenas entradas, Martha Nowill, atriz convidada, apresentou os climas e inspirações que geraram as composições ao ler trechos do livro que deu origem ao projeto, a biografia "Belchior - Apenas um Rapaz Latinoamericano", escrita por Jotabê Medeiros. No livro, os fatos específicos das várias fases da vida e da obra do compositor cearense são apresentados num assemblage que parte do perfil biográfico (iniciado com Belchior ainda vivo) e chega ao ensaio biográfico, com ares por vezes de biografia romanceada.
“Cantar Belchior é transcender qualquer expectativa. É muita sensibilidade e genialidade. Quando o público canta junto – e canta mesmo! –, dá uma emoção louca. Foi catártico, amoroso, delirante”, contou Ana Canãs.
Lembro-me que na época do seu falecimento, em 2017, circulou pelas redes sociais o pedido “Volta Belchior”. Durante o show tive a sensação de que ele não morreu. Apenas não está aqui e, como os grandes seres humanos, sempre viverá em nós como o eterno “rapaz latinoamericano”. Até a próxima.***
Leno F. Silva é diretor da LENOorb - Negócios para um mundo em transformação e conselheiro do Museu Afro Brasil. Escreve às terças-feiras no São Paulo São.