6ª Mostra Internacional de Teatro de São Paulo: espetáculos discutem violência, ficção e realidade, verdades e mentiras

A programação será aberta hoje, dia 14 de março com “A Repetição. História(s) do Teatro (I)”, peça do diretor suíço Milo Rau que causou burburinho no ano passado, quando foi encenada no Festival de Avignon, na França, e depois ganhou uma série de elogios da crítica internacional. É baseada no assassinato de um jovem gay, torturado e morto por um grupo de garotos há sete anos em Liège, na Bélgica. A peça coloca atores profissionais e amadores a relatar a história, como se participassem de uma audição.

“Rau é um diretor que está muito em destaque nos últimos tempos e hoje talvez seja uma referência no teatro documentário”, diz Antonio Araújo, diretor artístico da MITsp.

Em Compaixão. A História da Metralhadora, Milo Rau discute a atuação de ONGs europeias em território africano. Foto: Daniel Seiffert.

O suíço, artista em foco desta edição, terá mais dois trabalhos na mostra: “Cinco Peças Fáceis”, que discute casos de violência contra crianças, e “Compaixão. A História da Metralhadora”, um olhar crítico sobre a colonização europeia de territórios africanos.

Um contraponto a este último pode ser visto em “Alicerce das Vertigens”, do congolês Dieudonné Niangoun, que discute as consequências da herança colonizadora em seu país.

O Alicerce das Vertigens é o primeiro espetáculo de uma trilogia, também composta por Shéda e Nkenguegi. Foto: Jean Julien Kraemer

A discussão política também se faz presente num trabalho do diretor Felipe Hirsch que estreou no ano passado no festival chileno Santiago a Mil —coprodução da mostra vizinha e da MITsp. “Democracia” tem dramaturgia do escritor Alejandro Zambra e discute as consequências da ditadura chilena no país.

Democracia é uma coprodução entre a MITsp, Universidad Finis Terrae e Fundación Teatro a Mil. Foto: Divulgação.

Já a fronteira entre realidade e ficção norteia “Mágica de Verdade”, espetáculo do Forced Entertainment, grupo inglês de referência no mundo, que cria um quiz repetitivo para mostrar absurdos cotidianos; “Partir com Beleza”, no qual o franco-marroquino Mohamed El Khatib recria a morte da mãe; e “MDLSX”, performance da italiana Silvia Calderoni que debate a androginia e as classificações de gênero.

Neste ano, a MITsp também contará com algumas estreias, todas nacionais e que debatem temas recentes da sociedade brasileira. Gabriela Carneiro da Cunha fala da população do rio Xingu afetada pela barragem de Belo Monte em “Altamira 2042”. 

A atriz transexual Renata Carvalho fala do corpo travesti em “Manifesto Transpofágico”, enquanto o coreógrafo Wagner Schwartz discute a questão da liberdade em “A Boba”. Nele, parte do quadro homônimo de Anita Malfatti, que teve dura repercussão quando foi apresentado, no início do século passado.

A história do corpo travesti é narrada pela atriz Renata Carvalho. Foto: De Souza.

Estes dois últimos são artistas que foram alvo de polêmicas, nos últimos anos, envolvendo seus trabalhos. Carvalho, que interpreta um Cristo transexual em “O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu”, teve sessões da peça vetadas pela Justiça após ser acusada de desrespeitar religiões. 

Já Schwartz foi chamado de pedófilo depois de uma sessão de “La Bête”, no MAM de São Paulo, no qual tem seu corpo nu manipulado pelo público —um vídeo de uma criança tocando a perna e a mão do artista viralizou na internet e gerou protestos.

Os novos espetáculos, afirma Araújo, são respostas importantes para os dias de hoje. “A arte está num momento muito delicado, é hora de fortalecer os artistas. Vemos em ‘A Boba’, por exemplo, um Wagner fortalecido. Ele joga com a repercussão ruim [do caso ‘La Bête’, em que Schwartz chegou a receber cerca de 150 ameaças de morte].”

Fortalecida também está a MITbr – Plataforma Brasil, plataforma iniciada no ano passado, ainda em caráter experimental, e que traz programadores de festivais estrangeiros (neste ano, virão ao menos 25) para assistir a trabalhos brasileiros —que terão legendas e programas em inglês. 

A relação entre o performer Wagner Schwartz e a obra A Boba, de Anita Malfatti é o ponto de partida do espetáculo. Foto: Mario Miranda Filho.

A ideia é facilitar a exportação do teatro nacional, ainda pouco conhecido lá fora, segundo Araújo. Nesta edição, serão dez espetáculos, com destaque para as obras da coreógrafa Marta Soares.

A plataforma é uma das frentes que vêm impulsionando a MITsp. Depois de anos de queda de orçamento, 2019 vê uma alta da verba, que deve chegar a R$ 3,1 milhões em aportes diretos, fora os apoios, que ainda não foram todos fechados, explica diretor de produção do festival, Guilherme Marques. No ano passado, o orçamento total foi quase R$ 1 milhão menor. 

Sendo assim, a mostra também inaugura neste ano um projeto de intercâmbio dramatúrgico, tendo seis textos brasileiros traduzidos e editados na frança e seis textos francófonos traduzidos e publicados aqui pela editora Cobogó —entre eles, uma obra de El Khatib, “C’Est la Vie”.

o solo MDLSX, da atriz Silvia Calderoni, mistura fragmentos autobiográficos e evocações literárias. Foto: Simone Stanislai.

Além disso, a MITsp fará uma espécie de extensão no Rio, com parte da programação, como o espetáculo “Repetição” e alguns debates, acontecendo em espaços cariocas.

Seminário

Durante a Mostra Internacional de Teatro de São Paulo – MITsp, um Seminário (inscrições aqui) reunirá artistas, programadores, produtores, gestores, diplomatas, parlamentares, empresários e representantes de governo para pensar o panorama dos programas e projetos de internacionalização das artes cênicas brasileiras e as cooperações diplomáticas como chaves para o desenvolvimento social, econômico e humano.

A mostra promoverá o II Seminário de Internacionalização das Artes Cênicas Brasileiras.Foto: Divulgação.

Fortalecer mecanismos de cooperação e integração internacional a partir da cultura significa não somente abrir espaços de projeção e valorização da arte e da diversidade brasileiras, confrontando os trabalhos de criação e circulação com outras realidades, mas principalmente posicionar as políticas culturais como ativo imprescindível para a superação de desafios mundiais e para a resolução de conflitos políticos internacionais. Desenvolver e aprimorar mecanismos que permitam projetar externamente os valores culturais, a exemplo de França, Reino Unido, Estados Unidos e outros locais que já possuem incorporados a uma política externa o desenvolvimento de pesquisas e indicadores culturais é fundamental para fomentar um debate crítico marcado pelo protagonismo da cultura na aproximação entre povos, no estímulo ao respeito mútuo e na promoção de desenvolvimento e sustentabilidade.

Serviço

Imagem: Divulgação.

6º MITsp

De 14 a 24 de março, no Auditório Ibirapuera, em unidades do Sesc e outros teatros. 

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Fonte: https://mitsp.org/2019/

 

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