Bicicletas, mais verde, menos acidentes e poluição: os planos da Prefeita para tornar Paris mais humana

Hidalgo propõe uma “cidade de 15 minutos” – uma forte ruptura com o urbanismo moderno tradicional. Sua visão de cidade inclui muito uso misto do solo, com atividades comerciais, sociais, culturais e oportunidades de trabalho, todas no mesmo bairro e próximas também de locais para moradia. A abertura de mais espaço nas ruas para pedestres e ciclistas também foi fundamental para ajudar os parisienses a se adaptarem à pandemia de Covid-19. Tanto quanto para combater a atual crise, a cidade também trabalha para reforçar a resiliência contra futuros impactos climáticos e a piora da poluição do ar.

Pedestrianização permanente do Sena

A reeleição dá à prefeita Anne Hidalgo um novo mandato para mais esforços de pedestrianização como a transformação das margens do Sena. Foto: Christophe  Archambault / AFP.

No verão de 2002, na gestão do prefeito Bertrand Delanoe, Paris começou a instalar espécies de praias temporárias para atividades de lazer. A ação começou na margem esquerda do Sena e foi estendida para a margem direita em 2006. Chamada de Paris Plages (ou Praias de Paris), a iniciativa mostrou-se popular entre moradores e visitantes que gostam de usufruir espaços públicos livres de carros.

Quando Anne Hidalgo assumiu a prefeitura em 2014, propôs a pedestrianização permanente das margens do rio, a fim de garantir a pedestres, ciclistas e outras atividades livres de carro um espaço privilegiado no coração da cidade – e que seria um símbolo da transformação urbana sob sua administração. A medida foi implementada em 2016, mas sofreu forte oposição e entraves legais impostos por grupos conservadores e que fazem lobby por carros. Finalmente, em 2018, um tribunal local ratificou a política de Hidalgo e afirmou que a margem do rio poderia permanecer fechada para carros.

O processo de pedestrianização continuará por muitas áreas da cidade nos próximos seis anos, de acordo com os planos da prefeita. Mais espaço será concedido a pedestres e bicicletas, ocupando áreas antes usadas pelos carros principalmente para estacionamento (72% dos locais de estacionamento nas ruas da cidade devem ser removidos).

Mais ciclovias seguras

Em seu primeiro mandato, Hidalgo prometeu implementar mil quilômetros de ciclovias permanentes. Foto: Velib / Divulgação.

Diferentemente de outras cidades do norte da Europa, Paris não tem uma forte tradição no uso da bicicleta. Em 2010, bikes representaram apenas 3% de todos os deslocamentos realizados na cidade, em comparação com os índices de 37% em Copenhague e 33% em Amsterdã. Mesmo assim, Paris tem estimulado a prática nos últimos anos, por meio de ações como o lançamento de um dos sistemas de compartilhamento de bicicletas mais reconhecidos no mundo, o Vélib. Lançado em 2007 com 750 estações e sete mil bicicletas, o sistema hoje possui cerca de 1,4 mil estações e 20 mil bicicletas, sendo 30% delas elétricas. Embora o processo de transição para uma nova empresa operadora em 2019 tenha sido difícil, o sistema está melhorando com o tempo e é um componente essencial do plano de Hidalgo de tornar Paris uma cidade ciclista.

Em seu primeiro mandato, Hidalgo prometeu implementar mil quilômetros de ciclovias permanentes. Em dezembro de 2019, um pouco mais de metade da meta estava concluída. Durante a pandemia de Covid-19, a cidade anunciou planos para outros 50 quilômetros de ciclofaixas rápidas, pop-up, para reduzir a lotação no transporte coletivo. A emergência de saúde também permitiu que a cidade avançasse alguns projetos existentes, como fechar o tráfego de veículos ao longo do Canal Saint-Martin.

A longo prazo, Hidalgo disse que a cidade manterá a construção de ciclovias, assim como uma série de outras pequenas mudanças na legislação, incluindo a permissão para bicicletas no contrafluxo em vias de mão única com limite de velocidade de 30 km/h, a criação de 10 mil novas vagas de estacionamento para bicicletas e a disponibilização de uma bolsa de 400 euros para ajudar famílias elegíveis a comprar bicicletas de carga.

Limite de velocidade padrão: 30 km/h

Estudos demonstraram que a velocidade é o fator mais importante na gravidade dos acidentes de trânsito. Foto: BFMB.

Até o final de 2020, 85% da área central de Paris terá limite de velocidade de 30 km/h, com exceção de avenidas mais largas como a Champs-Élysées e a Boulevards des Maréchaux, nas quais o limite será de 50 km/h. A cidade também planeja transformar seu anel viário, hoje congestionado, com a redução do limite de velocidade de 70 km/h para 50 km/h, construção de uma faixa prioritária para transporte compartilhado, redução do número de faixas de tráfego e melhorias de segurança para a travessia de pedestres e ciclistas. Em seu manifesto, Anne Hidalgo diz que quer refazer a rodovia, transformando-a em uma “pacífica avenida urbana” e, com isso, “apagar gradualmente essa fronteira de outra era”.

Além de reduzir a poluição do ar e sonora para quem mora e trabalha em torno do anel viário, essas mudanças visam melhorar a segurança no trânsito, principalmente entre os usuários mais vulneráveis, como pedestres e ciclistas. Estudos demonstraram que a velocidade é o fator mais importante na gravidade dos acidentes de trânsito.

Proibição de veículos poluentes

Em 2016, depois de anos de aumento da poluição atmosférica e do congestionamento, Anne Hidalgo proibiu a circulação, em dias úteis, de todos os veículos movidos a gasolina fabricados antes de 1997, e em 2018 veículos a diesel fabricados antes de 2001 foram adicionados à lista. Mesmo antes disso, a cidade – que se comprometeu a ser neutra em carbono até 2030 – já havia decidido tirar os veículos a diesel de circulação até 2024, para sediar as Olimpíadas sem poluição, e eliminar os veículos a gasolina até 2030.

Esses compromissos, claro, geraram reações por parte dos usuários de carros e da indústria automobilística, mas a reeleição dá a Hidalgo um novo mandato para cumprir essa promessa.

Uma vez que a Covid-19 impactou redes de transporte urbano em todas as partes do mundo, o exemplo de Paris pode ser replicado em muitos lugares. A transformação exige persistência e vontade política, qualidades que Hidalgo já comprovou possuir. Líderes como ela mostram como é possível transformar uma megacidade em um ambiente sustentável, seguro e saudável.

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Dario Hidalgo é Pesquisador Sênior de Mobilidade e, baseado em Bogotá, apoia a equipe global de engenheiros e planejadores de transporte do WRI Ross Center for Sustainable Cities. Apesar do sobrenome, Dario não tem parentesco com Anne Hidalgo.

 

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