Botucatu, antes recordista no estado, reduziu acidentes de trânsito com metas bem claras

Um tempo atrás, fui conversar sobre caminhabilidade e tendências de mobilidade com grupos de secretários municipais de trânsito e transporte, de várias cidades do estado de São Paulo que participam de um programa estadual.

O curso foi organizado pelo Centro de Liderança Pública, para o programa de redução de acidentes do estado, chamado Movimento Paulista de Segurança no Trânsito.

Os municípios que participam do programa aprendem juntos quais são as boas práticas e trocam experiências periodicamente. Em vários deles, há coisas muito interessantes sendo feitas. Conheci alguns secretários que mostraram não só ações para reduzir acidentes mas também para melhorar a vida de quem anda a pé: caminhabilidade e mobilidade.

Em Botucatu, a repercussão da violência no trânsito mobilizou a cidade para uma resposta rápida 

Rodrigo Fumis, Secretário Adjunto de Mobilidade Urbana.Um dos bons exemplos é Botucatu. Em 2016, foi apontada como um dos municípios com os piores indicadores de mortes no trânsito do estado de São Paulo. Em 2017, a cidade começou a reverter isso. As mortes caíram 76%.

Rodrigo Fumis, Secretário Adjunto de Mobilidade Urbana, conta que a prefeitura resolveu atacar de frente o problema depois que os péssimos números de 2016 começaram a ser divulgados. O trânsito  feroz matou 37 pessoas naquele ano.

Numa cidade de aproximadamente 140 mil habitantes, o número colocava Botucatu perto do topo do nefasto ranking de fatalidades: quase 25 pessoas em cada 100 mil habitantes, mais de três vezes o mesmo indicador na cidade de S.Paulo. A repercussão do indicador foi o estopim para um plano de melhoria do trânsito.

A principal ação foi a redução de velocidades de 60 para 50 km/hora em algumas vias e de 50 para 40 km/hora em outras, com instalação de radares.

Além disso, a secretaria de Mobilidade Urbana identificou os principais pontos de acidentes e começou a fazer o chamado  traffic-calming, o redesenho das ruas e da sinalização para diminuir a velocidade dos carros. Para os pedestres, pintura de faixas de travessia e lombofaixas.

Foto: Prefeitura Municipal de Botucatu.

Em 2017, o município comemorou a queda dos números de mortes no trânsito: de 37 para 13, uma média de 9 por 100 mil habitantes.  Em 2018, o número parece estar mais baixo ainda. Nenhuma morte de pedestre. O que se pode aprender com isso?

 A historinha de Botucatu é exemplar e leva a pensar em pelo menos três aprendizados.

1. Ações simples funcionam, desde que acompanhadas de controle e fiscalização

Parece pouco, mas um município pequeno ou médio precisa encontrar a disposição e dinheiro para contratar o serviço de radares, que são caros, para ficar de olho no resultado e para não deixar que outros temas apareçam e diminuíam o foco na iniciativa.

Foto: Prefeitura Municipal de Botucatu.

Nas boas conversas com os secretários e responsáveis pelo trânsito, entendi que o programa é baseado em acompanhamento regular dos indicadores e medição de resultados.

O controle parece ser mais efetivo quando se nota que há outras cidades fazendo a mesma coisa. Essa pequena competição entre as cidades participantes do Movimento, como eles chamam, parece saudável para ver quem faz mais para reduzir as mortes e melhorar a urbanidade nas diversas cidades.

2. Para enfrentar as resistências previsíveis, é preciso uma visão e uma meta

A cidade, em algum momento, resolveu que a violência no trânsito precisava acabar. Essa disposição dá força para encarar as reações negativas, que sempre vão existir, em Botucatu, São Paulo ou Nova York.

Dados do programa Siga Seguro. Fonte: Movimento Paulista de Segurança no Trânsito.

Rodrigo conta que a constatação da necessidade de mudança foi catalisadora: “Como vivíamos um cenário caótico, que necessitava de ação urgente para garantir a segurança de todos, a princípio, a resistência não foi tão grande, mas na segunda etapa do projeto quando começamos a ampliação das áreas acalmadas e a operação de fiscalização eletrônica, encontramos certa resistência”. Com os resultados começaram a aparecer rapidamente, a  prefeitura pôde seguir em frente.

A meta que o programa estabeleceu para os municípios participantes é cortar pela metade os casos de mortes em todos os municípios participantes.

Esse acompanhamento mensal só pode acontecer com métricas claras. No estado de São Paulo existe um relatório que é chamado de Infosiga, e que mostra todos os acidentes de todos os municípios separados por modal de transporte. Existem falhas no relatório, como ficou claro na discussão sobre as marginais em São Paulo, mas é fundamental ter uma base de comparação, que só foi criada há dois anos.

3. Gestão e política não são antagônicas

Temos assistido a debates em que se colocam gestão e política como estilos antagônicos ou como diferencial de atuação de candidatos. Não faz sentido separar a gestão – a capacidade de ir melhorando o que se faz, um pouco a cada dia, e a política – a capacidade de envolver as pessoas em direção a uma visão de futuro.

Foto: Jornal Acontece Botucatu.

Os bons exemplos de ação efetiva para melhorar a vida das pessoas, como esse do trânsito,  mostram que os bons planos e as boas execuções só acontecem quando gestão e política são entendidas como um conjunto de habilidades para resolver questões da cidade: são dois aspectos essenciais para que um bom plano seja gerido com legitimidade e executado com precisão.

No caso do trânsito, esperamos que os resultados sejam permanentes e que as pessoas possam viver suas vidas sem a incerteza de saber se vão chegar sãs e salvas até o outro lado da rua. O Movimento Paulista pela Segurança no Trânsito, quem sabe, pode começar a debater uma meta mais ousada, a Visão Zero, que é a meta que as cidades mais importantes do mundo colocaram para si próprias, a de que ninguém morra no trânsito.

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Mauro Calliari é administrador de empresas, mestre em urbanismo e consultor organizacional. Artigo publicado originalmente no seu blog Caminhadas Urbanas. 

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