Carro, trem, bicicleta… o vai e vem dos europeus

Estudo da Comissão Européia apresenta dados consolidados de 28 países-membros sobre a mobilidade no continente. Foto: Getty Images.

Por Marcos Freire.


Nesses quase quatro anos de vida na Europa eu já devo ter pedalado alguns milhares de quilômetros sobre uma bicicleta, mais até do que o que fiz sobre trilhos, mas menos do que já me desloquei de carro. Sim, admito que para os trechos mais longos ainda não substitui o meu velho carrinho (a diesel, para piorar…) pelas ferrovias. Não sei se serve de consolo, mas ao menos dentro da cidade eu pouco pego o carro: dá para fazer praticamente tudo caminhando ou pedalando.

Mas como está hoje a malha de transportes na Europa? O jornal Público trouxe recentemente um interessante infográfico com informações gerais sobre os meios de locomoção dos europeus. Além deste material, outra fonte importante ajuda a entender como se deslocam os europeus: um dos mais recentes estudos encomendados pela Direção Geral de Mobilidade e Transportes da Comissão Européia (Eurobarometer 495, publicado em 2020) apresenta dados consolidados de 28 países-membros (na data da pesquisa, o Reino Unido ainda estava no grupo) sobre a mobilidade no continente. E o resultado mostra que ainda há uma estrada longa a ser percorrida para que o carro perca a hegemonia.

Tráfego de carros no centro de Dublin, capital da Irlanda, uma das mais congestionadas da Europa. Foto: Dublin News.
Tráfego de carros no centro de Dublin, capital da Irlanda, uma das mais congestionadas da Europa. Foto: Dublin News.

De acordo com o estudo da Comissão Europeia, o carro é o meio de transporte preferido por 52% das pessoas nos deslocamentos cotidianos. Mas esse valor médio esconde realidades nos extremos. Na Eslovênia (71%), Irlanda (68%) e Chipre (89%), o carro é ainda mais presente. Por outro lado, em países como Romênia (35%) e Hungria e Bulgária (ambas com 36%) a presença do carro é menor. No resultado geral dos 28 países, o segundo “veículo” mais usado no dia-a-dia são os próprios pés: as caminhadas representam 17% dos deslocamentos, acima do uso do transporte público (16%), dos scooters e bicicletas (8%), das motocicletas (2%) e das bicicletas ou patinetes de uso compartilhado (1%).

Mas em qualquer uma dessas modalidades, as diferenças também são grandes quando se olha país por país. As caminhadas são mais comuns na Bulgária (34%) e na Espanha (30%) e menos frequente na Holanda e em Chipre (5%) e em Luxemburgo e na Dinamarca (7%). Em relação ao uso do transporte público, cerca de 20% das pessoas em 12 dos 28 países pesquisados disseram ser este o principal meio de locomoção diário, percentual que sobe na Lituânia (26%) e em países como Bulgária, Romênia e Estônia (23%), mas que representa uma fatia muito menor da preferência da população na Holanda (4%) e na Dinamarca (6%). E as bicicletas? Na Holanda, é o modo de transporte escolhido por 41% da população; na Suécia, 21% disseram que usam a bicicleta como principal meio de locomoção.

O TGV é um trem de alta velocidade que opera em toda a França e fora do país. Foto: SNCF.

Dados como esses ajudam a entender como os europeus se deslocam no dia-a-dia das grandes cidades, indo para o trabalho ou nos momentos de lazer. Mas há ainda outras informações que completam essa radiografia da malha europeia. Nas ferrovias, por exemplo, a Polônia é o país que tem a maior extensão de linhas, com mais de 37 mil quilômetros de trilhos, seguida pela França (pouco mais de 27 mil km), Itália (24,5 mil km) e Espanha (quase 22 mil km). Portugal, infelizmente, aparece na parte inferior da tabela, com pouco mais de 3 mil km. E se há trilhos, é preciso locomotiva: Polônia (3800 unidades) e França (3200 unidades) também estão no topo da tabela, enquanto Portugal aparece bem mais abaixo, com 125 unidades. A pequena Kosovo, com seus menos de 2 milhões de habitantes, está no fim da fila, com 440 quilômetros de vias férreas e 9 locomotivas.

Em relação às estradas, o panorama muda completamente. A Polônia, líder nas ferrovias, aparece na nona posição entre os países europeus, com pouco mais de 1,5 mil km de autoestradas. Em primeiro lugar, a Alemanha (pouco mais de 13 mil km), seguida pela França (com 11,6 mil km), e por Portugal, na terceira, mas distante posição, com 3 mil km. Curiosamente, a relação de autoestradas com quantidade de veículos não é tão direta quanto no caso das ferrovias, uma vez que o índice da quantidade de veículos é feito em relação à população total do país. Ou seja, a Alemanha, com a maior malha viária da Europa, está na nona posição na quantidade de veículos por 1000 habitantes (574). Liechtenstein (781 veículos por mil habitantes, ou seja, há quase um carro por habitante!) e Luxemburgo (681) são os dois países no topo da tabela da quantidade de veículos por habitantes, mas que apresentam poucas autoestradas. Portugal está na posição de número 14 no ranking de carro por habitantes (530 a cada 1000 pessoas), apesar do terceiro lugar em extensão de autoestradas.

O porto de ou Roterdã é o maior porto marítimo da Europa e um dos três de maior movimentação do mundo. Foto: Rotterdam-Partners.
O porto de Roterdã é o maior porto marítimo da Europa e um dos três de maior movimentação do mundo. Foto: Rotterdam-Partners.

Da terra para o mar, os países que mais movimentam mercadorias nos portos marítimos (em toneladas) são Holanda, Itália e Espanha. E os principais portos são os de Roterdam (Holanda), Antuérpia (Bélgica) e Hamburgo (Alemanha). Mas quando passamos a olhar o volume de passageiros, a Itália assume a liderança, seguida pela Grécia, Dinamarca e Espanha. Pelos ares, a Alemanha se mostra como o grande ponto de entrada e saída da Europa, com três aeroportos entre os cinco maiores em quantidade de voos comerciais (Frankfurt e Munique, nas duas primeiras posições, e Berlim, no quinto lugar). Bruxelas, na terceira posição, e Copenhagen, no quarto lugar, completam a lista dos 5 mais movimentados aeroportos europeus.

Vale lembrar que 2021 é um ano especial para a mobilidade sustentável na Europa, que tem dado foco no importante papel que o transporte ferroviário tem a desempenhar na contribuição para o objetivo do Acordo Verde da UE de se tornar neutro para o clima até 2050. A Semana Europeia da Mobilidade, que aconteceu em setembro e celebrou a sua vigésima edição, teve a participação de 50 países, que organizaram eventos e se mobilizaram em torno do tema “Seguro e Saudável com Mobilidade Sustentável”. Ao ver todos esses dados mostrando a ainda relevante presença do automóvel no cotidiano das pessoas, fica claro que o caminho para que tudo entre na linha, ou melhor, nos trilhos, vai exigir muito esforço e mudança de hábitos.

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Leia também: Sebo nas canelas!

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Marcos Freire
Marcos Freire mora com a família em Ovar, Portugal, pequena cidade perto do Porto, conhecida pelo Pão de Ló e pelo Carnaval. Marcos é jornalista, com passagens pelas principais empresas e veículos de comunicação do nosso país.

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