Como os empreendedores estão transformando o Centro de São Paulo

Na última quinta-feira,7, eles contaram suas histórias de empreendedorismo e inovação, junto com representantes do Sesc, Sebrae, Porto Seguro e do poder público municipal, na primeira edição do “Diálogos A Vida no Centro”, ciclo de debates e networking realizado pelo hub de inovação e cultura A Vida no Centro que reuniu empresários e influenciadores da economia criativa para discutir a região, que passa por um momento de grande efervescência e transformação.

Além de debates, a programação incluiu também uma exposição de fotos do projeto CalçadaSP, criado pelos publicitários Wans Spiess e Tony Nyenhuis, e um grafite de Ciro Schu, um dos principais grafiteiros de São Paulo, finalizado ao vivo pelo artista. Depois dos painéis, um happy hour no terraço da nova unidade, com vista para ícones do Centro, como Farol Santander, o Edifício Itália e o Copan, onde público e debatedores puderam continuar a troca de ideias.

Centro redescoberto

 “O Centro precisa ser redescoberto, e para isso acontecer é necessário, entre outras coisas, que ele seja discutido por todas as pessoas que fazem parte de seu ecossistema. É por isso que organizamos este evento. A região vive um momento de grandes transformações culturais e inovadoras, ao mesmo tempo em que ainda tem inúmeros desafios a vencer”, sintetizou o jornalista Clayton Melo, empreendedor e cofundador do A Vida no Centro, na abertura do encontro.

O local do evento foi um prédio da década de 1950 que passou por um retrofit – reforma total de instalação elétrica, hidráulica e de acabamentos, aproveitando a estrutura de construção. O ULIVING 433 será inaugurado até julho como uma residência estudantil totalmente conectada aos hábitos e comportamento dos jovens estudantes.

“O Centro tem inúmeros aspectos que nos convidam a viver na região. O primeiro deles é a mobilidade. Nenhum outro bairro tem tantos ônibus, estações de metrô e tanta facilidade para fazer tudo a pé, já que é todo plano. Outra vantagem é o polo de entretenimento no qual vem se transformando”, afirma Juliano Antunes, presidente da ULIVING Brasil.

Para Christophe Van Hamme, sócio da MMC Investimentos, parceira do projeto ULIVING 433, a velocidade de transformação do Centro vai depender da velocidade de expansão do retrofit, processo que ainda enfrenta várias dificuldades, de falta de financiamento a excesso de burocracia na hora de transformar o edifício. “O retrofit é uma acupuntura urbana”, diz ele.

Apesar da grande variedade de centros culturais, teatros e restaurantes, o Centro de São Paulo ainda está longe de explorar todo o seu potencial nesta área. Fábio Balestro, sócio do recém-inaugurado complexo de entretenimento Tokyo, na rua Major Sertório, percebeu isto – e muito mais. “Acreditamos que existam dois modelos de cidade que são conflitantes: ou se afastar do Centro, aumentando o tempo de deslocamento e criando mais engarrafamentos na cidade, ou tornar o Centro da cidade um lugar agradável, seguro e dinâmico. Nossa visão é investir nesta segunda opção, a da revitalização, ainda mais num Centro tão rico em vários aspectos como o de São Paulo”, afirma. Balestro participou do primeiro painel do Diálogos: “Como os novos negócios estão transformando o Centro de São Paulo”. Ao lado dele, a criadora do Drosophyla Bar, Lilian Varella, o gerente do Centro regional Centro do Sebrae, Alexandre Robazza, e o prefeito regional da Sé, Eduardo Odloak.

Juliano Antunes, presidente da ULIVING Brasil no Painel: "Por que investir no Centro de São Paulo".

A mediadora do debate, Denize Bacoccina, jornalista e cofundadora do A Vida no Centro, destacou que o centro de São Paulo vem passando por grandes transformações, com novos empreendimentos e aumento de moradores, atraídos pelo estilo de vida mais sustentável, com facilidade de locomoção e grande oferta de atividades culturais e de lazer. Se até o fim do século passado o Centro vinha perdendo população, hoje a região da República é a campeã de lançamentos imobiliários em São Paulo. “Entre 2014 e 2016, período mais recente das estatísticas, essa região concentrava 15% dos lançamentos de toda a cidade”, disse Denize.

Opção pelo Centro

Lilian Varella, proprietária do Drosophyla, em casarão de 1920 totalmente restaurado na Rua Nestor Pestana, Centro de São Paulo.Foto: A Vida No Centro.

“O Centro é um lugar fervilhante e eu gosto de ficar onde a história acontece”, disse a empresária Lillian Varella, do Drosophyla Bar, instalado em um casarão de 1920 tombado pelo patrimônio histórico, na rua Nestor Pestana. É verdade que a primeira localização paulistana do Drosophyla, bar criado há 32 anos em Minas Gerais, não foi no Centro, mas em uma travessa da rua Consolação, a Pedro Taques. Mas Lillian conta que, até então, todos os lugares ocupados pelo bar em sua história correspondiam às condições financeiras do momento, não eram exatamente uma escolha.

Quando foi possível decidir qual seria o lugar ideal, ela não teve dúvidas de que seria o Centro. “As pessoas estão conseguindo perceber que o Centro está mudando, muitos empreendedores estão envolvidos nesta mudança e penso que é necessário que o poder público entre neste movimento não para dar um ‘empurrãozinho’, mas um ‘empurrãozão’ a fim de alavancar esta revitalização e dar exemplo para todo o Brasil.”

A parte do governo

A esquina das duas Avenidas clássicas no Centro de São Paulo. Foto: Getty Images,

Ao tomar a palavra, o Prefeito Regional da Sé, Eduardo Odloak, parabenizou os “desbravadores” do Centro, mas também revelou os problemas e desafios da administração pública. Odloak ressaltou a vantagem da diversidade de pessoas que circulam pelo Centro e a presença de todos os modais de transporte no local, dizendo que há um projeto para criar sistemas de mobilidade circular, ligando os pontos culturais da região.

No entanto, diz que há entraves na legislação e uma quantidade grande de prédios tombados que levam o empreendedor a enfrentar uma burocracia diante da qual muitos desanimam a investir. “Existe também uma percepção de insegurança por parte da população que é maior que a realidade. Considerando o fluxo de pessoas, o índice de furtos de celular, por exemplo, é menor que o da Paulista e da Faria Lima”, afirmou. Segundo ele, a prefeitura vem buscando soluções para problemas como os pontos de doações de alimentos para moradores de rua, desafogando locais como a Praça da Sé, onde são distribuídas 3 mil refeições por dia, e criando locais com estrutura mais adequada, com banheiros, onde as pessoas possam tomar banho e dormir. “Precisamos de mais centros de acolhimento”, disse ele.

A cultura no Centro

 Complexo Cultural Porto Seguro situado na Alameda Barão de Piracicaba bem na esquina com a Rua Ribeiro da Silva. Foto: Mario Rodrigues.

No segundo painel, “O papel da cultura na retomada do Centro de São Paulo”, foram apresentados cases como o da Porto Seguro, que instalou no bairro Campos Elíseos um teatro e um espaço cultural. “Foi um desafio no começo, em 2015, mas atraímos o público e já recebemos mais de 400 mil pessoas, trazendo vida para um lugar onde a gente já atuava e acreditou que tinha potencial para receber nosso complexo cultural”, afirma Renata Aguiar, gerente de Marketing Institucional da Porto Seguro.

Cerca de 15 anos antes, um grupo de teatro entrou para a história de São Paulo ao escolher trabalhar em um lugar que na época era abandonado pelo poder público e povoado por traficantes e travestis, a Praça Roosevelt, hoje uma referência cultural da cidade, com vários teatros e mais de dez bares. “Nos anos anteriores, tínhamos vivido na Europa e, quando voltamos, fomos para Curitiba. Mas nosso sonho era São Paulo, por sua pulsação e intensa vida cultural. É uma cidade muito energética. Você chega nela e parece que ela te toma por completo”, afirma Rodolfo García Vázquez, um dos fundadores da Cia. de Teatro Os Satyros.

Ele conta que o grupo poderia ter ido para algum bairro mais “cool”, mas desde o começo tinha o objetivo de dialogar com a cidade e não com um bairro. E isso só poderia ocorrer no Centro, onde circulam pessoas de todos os pontos de São Paulo. Ao escolherem a Roosevelt, encontram um ambiente perigoso, com traficantes e bandidos e que tinha até um hotel de prostituição de travestis. Eles decidiram se aproximar dessa população e estabelecer um diálogo, que ao longo do tempo evoluiu para oportunidades de emprego no próprio grupo teatral para algumas travestis e traficantes. Foi o começo de uma transformação cultural tão grande que, com a chegada de outros teatros e bares para o local, a Roosevelt ganhou vida e, anos depois, levou o poder público a reformar a praça, reconhecendo ali um local especial para todos os que moram em São Paulo.

Sesc ocupa o Centro

  Térreo do SESC da Rua 24 de Maio, Centro de São Paulo. Foto: ArchDaily.

Já o Sesc, reconhecido pelos moradores da cidade pela excelência na proposta cultural que oferece, inaugurou em agosto passado a sua unidade na rua 24 de maio. Menos de um ano depois, recebe uma média de 8 a 10 mil visitantes por dia. “Optamos pelo local por uma questão pragmática. Ali há a maior concentração de trabalhadores do comércio de bens e serviços do país. E o Sesc é direcionado principalmente a este público”, diz Thiago Freire, gerente-adjunto do Sesc 24 de Maio. Motivo semelhante levou o Sebrae-SP a abrir uma unidade na mesma rua do Sesc. “Ali, estamos de fato perto dos micro e pequenos empreendedores”, diz Alexandre Nunes Robazza, gerente-regional do Sebrae-SP, citando ainda que a instituição passou a ser mais procurada por artistas, como músicos, querendo se qualificar também como empreendedores, já que muitos precisam cuidar pessoalmente também da parte formal da carreira.

Freire destacou a arquitetura do Sesc 24 de Maio, assinada pelo mais renomado arquiteto brasileiro, Paulo Mendes da Rocha, que criou um prédio todo envidraçado capaz de colocar em comunicação direta e ininterrupta a pessoa que está dentro do Sesc com as ruas, com a cidade. “O prédio abraça a cidade e, ao mesmo tempo, faz com que a pessoa se sinta fora dele”, diz ele.

Para o arquiteto e urbanista Renato Cymbalista, professor Livre Docente da FAU-USP, a arquitetura e o urbanismo têm papéis importantes em processos de ocupação do Centro, mas isso não é suficiente. O papel principal é dos atores que decidem ocupar a região, como investidores, empresários e o poder público”.

O desafio da inclusão social foi destacado pelo vereador José Police Neto, também presente no debate. “Com os empreendimentos que estão revitalizando a região, o Centro avança muito da soleira para dentro. O problema é da soleira para fora: o desafio de ser inclusivo socialmente”, afirmou o vereador, autor de vários projetos relacionados à região, entre eles o Estatuto do Pedestre.

De certa maneira, é o que acontece em todos os casos relatados. A cada empreendimento, seja cultural, gastronômico, de entretenimento ou imobiliário instalado no Centro, as pessoas dão vida às calçadas, as ruas passam a ser mais seguras e assim vai se criando um círculo virtuoso. Trazendo o Centro de volta ao papel de protagonista na vida da cidade.

O evento teve o patrocínio da MMC Investimentos e da ULIVING Brasil, que sediou o projeto em sua nova unidade, o ULIVING 433 – e apoio institucional do Sebrae-SP e da Associação Viva o Centro.

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Por Maria Alice Rosa, A Vida no Centro. O São Paulo São apoia a iniciativa.

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