Os primeiros Parques Infantis foram implantados na cidade de São Paulo no ano de 1935, em bairros operários Lapa, Ipiranga e Mooca. Visaram promover atividades educacionais e culturais para as crianças de três a seis anos, com o foco na valorização da cultura nacional, sendo uma das estratégias o levantamento dos costumes e hábitos desse público. As ações assistências também se fizeram presentes com atendimento médico e odontológico e com a distribuição de copos de leites e frutas, conforme o fotografado por Benedito Junqueira Duarte em 1937, no Parque Infantil do Ipiranga.
Crianças brincando em tanques de areia sentadas, realizando jardinagem e se alimentando foram algumas das cenas selecionadas para compor o álbum de fotografias dos Parques Infantis, do Departamento de Cultura. Aliás, muitas dessas imagens foram fabricadas com a intencionalidade de divulgação de determinadas práticas educacionais promovidas pelas educadoras dos Parques Infantis, o que demonstra uma preocupação dos seus idealizadores no agenciamento de certas ações e, portanto, a construção de certa memória.
Parque Infantil Dom Pedro II, 1938. Foto: B. J. Duarte / Acervo da SMC.
Os significados dos Parques Infantis foram objeto de interesse também de Freitas (2001), em seu estudo do pensamento social brasileiro na transição do século XIX para o XX. O autor defende, a partir das considerações de Antônio Cândido (1971), que o Departamento de Cultura e a implantação dos Parques Infantis, sob a responsabilidade de Mário de Andrade se configuravam como iniciativas inovadoras de atendimento às crianças e suas famílias, ao promoveram situações que valorizavam suas experiências e dialogavam com as questões da cidade. Para Cândido apud Freitas (2001:265), essas instituições não realizavam somente a “rotinização” da cultura, mas se constituíam em uma “tentativa consciente de arrancá-la dos grupos privilegiados para transformá-la em fator de humanização da maioria através de instituições planejadas”.
As crianças de três a doze anos efetivaram sob a supervisão e orientação das educadoras esculturas em argila, marcenaria, danças, teatro, pinturas e desenhos. De acordo com Gobbi apud São Paulo (2010:25), os Parques Infantis promoviam concursos de desenhos, cujos temas eram de livre escolha das crianças.
Parque Infantil Dom Pedro II, 1938. Foto: B. J. Duarte / Acervo SMC.Havia uma orientação do próprio Mário de Andrade às educadoras de que não houvesse intervenção nos desenhos das crianças. Em um discurso pronunciado na Hora do Brasil no ano de 1935, Mário de Andrade apresenta os propósitos da criação dos Parques Infantis e qual sua relação com o fenômeno da urbanização em São Paulo. Em sua visão, "os grotões transformaram-se em jardins cortados ao meio pelas avenidas e pela sombra dos viadutos. Não há mais sapo. Nos jardins encontrareis recintos fechados com instrutoras, dentistas e educadoras sanitárias dentro. São Parques Infantis onde as crianças proletárias se socializam aprendendo nos brinquedos o cooperatismo e os valores do passado. São crianças tartamudeando em torno de uma Nau Catarineta de vinte, as melodias que seus pais esqueceram, e nos vieram de novo da Paraíba, do rio Grande do Norte e do Ceará. Todas essas iniciativas não poderão pretender jamais a uma gloríola no presente, senão uma fecundidade futura. Tudo é novo, e muito está nascendo. São Paulo é uma cidade num dia, mas já agora os seus caminhos conjuntos vão e vêm.“
Nesse sentido, os Parques Infantis eram tidos como lugares privilegiados na transmissão e na produção da cultura infantil. É possível dizer que, as imagens de crianças das classes operárias brincando em espaços planejados, com a supervisão de adultos capacitados, tendem a indicar os múltiplos sentidos acerca da infância.

Considerações finais
A experiência dos Parques Infantis nos convida a uma reflexão a respeito do lugar da infância nos anos 30 do século passado nos discursos e ações dos intelectuais brasileiros. Nesse sentido, a análise das intervenções do poder público, por meio da construção de políticas educacionais que abrangeram particularmente os filhos dos operários na cidade de São Paulo, torna-se uma discussão fértil no campo da História da Educação.
No cotidiano dos Parques Infantis o lúdico, as brincadeiras tradicionais infantis e os jogos constituíam-se em possibilidades de livre manifestação das crianças. Ao promoverem práticas pedagógicas, que objetivaram o desenvolvimento físico, intelectual e social das crianças, tais instituições idealizadas por Mário de Andrade foram responsáveis pela difusão de uma nova concepção de infância e de criança, além de institucionalizarem um conjunto de práticas específicas no campo da educação infantil, incorporadas às escolas municipais de educação infantil de São Paulo transformando-se em saberes necessários à proposição de atividades que visem o desenvolvimento social da criança.
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Maria Aparecida da Silva Cabral é professora adjunta do Departamento de Ciências Humanas, Curso História, da Faculdade de Formação de Professores da UERJ.
Artigo publicado nos anais do XVI Encontro Regional de História da Anpuh - Rio / Saberes e Práticas Científicas.
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