Moradores de favela carioca transformam lixão em parque ecológico

Não bastasse a vista deslumbrante, a favela do Vidigal, Zona Sul do Rio, ainda esconde um pequeno oásis. Há 10 anos Mauro Quintanilha começou a transformar um lixão no alto do morro em um parque ecológico, o Sitiê. O nome é a junção das palavras sítio com Tiê, um pássaro característico da região. “O mais bonito foi tirar o lixo e recuperar a terra. Então, o foco do Sitiê é isso. Transformar lixões crônicos em lugares assim, em projetos genuinamente da comunidade”, defende o músico e artesão, que está de malas prontas para a Colômbia.

 

Quintanilha vai apresentar seu projeto em um seminário sobre sustentabilidade em Medellín. Conhecida no mundo como reduto da organização criminosa cartel de Medellín, ela ostenta, desde 2013, o título de a cidade mais inovadora do mundo. A construção de uma escada rolante gigante e de um sistema de teleférico que facilita o acesso de moradores de áreas pobres ao centro da cidade foram consideradas pelo Instituto Urban Land, uma organização global que trabalha na busca da criação e gestão de comunidades prósperas em todo o mundo, como interferências urbanas fundamentais para mudar o perfil da cidade.

Antes de Medellín, o parque ecológico do Vidigal já havia sido replicado na Bolívia. O Sitié vem ganhando notoriedade e apoio nos últimos anos. “Contamos com a assistência jurídica da Fundação Getúlio Vargas e temos parceria com o Instituto Moreira Salles e outras entidades”, enumera Quintanilha. O arquiteto Pedro Henrique de Cristo, fundador do Cidade Unida – projeto que estuda ações de políticas públicas em comunidades pobres do Rio –, vem ajudando a dar visibilidade ao Sitié desde 2012, quando ocorreu na cidade a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, conhecida como Rio + 20.

Transformação lenta e gradual

O sonho de Quintanilha é transformar o Sitiê em um espaço alternativo, com um anfiteatro que levará música, poesia, além de atividades para as crianças. Nascido e criado no morro, ele conheceu a área onde hoje está o parque ecológico antes dela ser ocupada por um lixão. Na sua infância, nos anos 1960, o lugar era povoado por árvores frutíferas. A degradação começou após a invasão do local por algumas famílias. Em 2000, os moradores foram removidos pela prefeitura do Rio para outra área do morro. As casas foram derrubadas, mas o entulho ficou. Começava aí a degradação acelerada do lugar, que virou um lixão a céu aberto.

“Todo mundo lá de cima vinha jogar o lixo aqui. Tinha de tudo: televisão, fogão, geladeira, animais mortos… No verão, era um mau cheiro danado. Eu ficava com vergonha de morar aqui. Pensei até em ir embora do Vidigal, mas, ao mesmo tempo, pensava neste lugar lindo”, lembra Quintanilha. Incomodado com a situação, ele procurou a Comlurb e a Associação de Moradores, que, na época, não se mobilizaram para resolver o problema. Com a ajuda de um vizinho, Paulo Almeida, ele começou a limpar a área. “Nós começamos a tirar o cipó com dois facões cegos, sem luva, sem proteção, sem nada. Ficamos mais ou menos um ano fazendo assim, até que apareceram outros voluntários, que foram se revezando ao longo dos anos”, conta. Almeida hoje é coordenador dos garis comunitários.

Aos poucos, Quintanilha e Almeida ganharam a ajuda de voluntários. Só que os moradores continuavam jogando lixo. A mudança foi pavimentada quando os dois concluíram que para que romper com o ciclo vicioso, só retirando o lixo na mesma velocidade com que ele era jogado fora. A mentalidade demorou a mudar, mas mudou. “Hoje eles são nossos amigos, vêm colher os alimentos que a gente planta aqui. A transformação do lugar também transformou as pessoas”, comemora Quintanilha.

Hoje o Sitiê é um jardim de 8.000 metros quadrados, com flores e uma horta. Entulhos foram usados para encher pneus, que se transformaram em escadas e barreiras de encostas. Até privadas viraram vasos de plantas e os aros de bicicletas se tornaram objetos decorativos.

Fonte: Viva Favela. Fotos: Roberta Machado.

 

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