Na periferia ocupação de espaços e eventos no feriado prolongado

“Eu gosto é de desafio!”, enfatizou a dona de casa Mires do Carmo, 54, ao ver o cerco de seguranças crescendo ao seu redor quando foi impedida de usar o parquinho com a neta em um CEU da sua região, em Guaianases, na zona leste de SP. O caso ocorreu na última sexta (20).

“Vocês têm algum mandado para invadir? Não têm, então dá licença”, disse um estudante para um grupo de policias militares na Escola Estadual Raul Fonseca, zona sul. A instituição é mais uma entre as 74* ocupadas como forma de protesto contra a reorganização proposta pelo governo. O vídeo do enfretamento no portão da escola viralizou na internet.

Os desafios acima ilustram algumas das atitudes de empoderamento que marcaram os últimos dias e fizeram parte de eventos espalhados pelas periferias da capital e Grande SP, contemplando a programação do feriado de 20 de novembro, Dia da Nacional de Zumbi e da Consciência Negra.

Na sexta-feira, a Marcha da Periferia ocorreu em quatro pontos da capital paulista, em Guarulhos, na Grande São Paulo, e em Santos, no litoral. A redução da maioridade penal, o extermínio dos jovens nas periferias, a reorganização das escolas, o racismo eram algumas das principais pautas dos protestos. A Agência Mural conferiu quatro dessas edições. Três delas tiveram como ponto final escolas ocupadas.

“Viemos participar da marcha para mostrar que resistimos às propostas (de redução e organização) e ao Estado”, afirmou a estudante Jéssica Coelho, 17, que estava acompanhada de dois amigos na segunda edição da marcha, em Guarulhos.

Na Brasilândia, zona norte, cerca de 30 alunos que fazem parte do movimento de ocupação da E.E. Martin Egidio Damy, desde o último dia 16, se uniram aos coletivos para marchar. “Estamos bem organizados, nos dividimos em comissões, tarefas e fazemos assembleias. Estamos em contato com as outras escolas e a ideia é ampliar o movimento para mais escolas e exercer mais pressão contra o governo”, conta a estudante Marina Cintra, 20.

Além da pauta estudantil, manifestantes ressaltaram a importância da luta contra o racismo e a exclusão social. “Não faz sentido fazer marcha para o povo negro no centro da cidade, porque a região central é onde vive mais a elite. É importante a gente colocar nossa pele à mostra, levantar nossa voz, e dizer que o povo da periferia tem reivindicações, sim”, disse o metroviário Vitor Ribeiro, 26, que participou da Marcha da Periferia no Grajaú.

O rapper Francisco Vidal, 36, do Família Rap Nacional Rap (FRN) e um dos organizadores, destaca: “A marcha é consequência de inúmeras atividades feitas no decorrer do ano, não vivemos de datas comemorativas”.

“Nós sofremos com o racismo todos os dias, nas escolas, nos hospitais. As pessoas não gostam de falar; é encoberto. Crianças pretas quase não aparecem em comerciais de TV e esse tipo de movimento ajuda a abrir a cabeça das pessoas”, avalia a cabeleireira Dirce Moreira Cezar, 65, que assistiu a marcha da Brasilândia.

A observação da cabeleireira negra sobre a forma como os negros aparecem na televisão se relacionou com o debate em torno da mulher da periferia e a cobertura da mídia, proposto durante a abertura da exposição “Quem Somos [por nós]”, do coletivo Nós, Mulheres da Periferia. O evento ocorreu no último sábado (21), no CCJ (Centro Cultural da Juventude), na Vila Nova Cachoeirinha, zona norte.

Foi nesse bate-papo que dona Mires foi aplaudida após contar sobre como desafiou os guardas que tentaram impedir a entrada dela com sua neta em um CEU. “Achei um absurdo em pleno feriado da consciência negra o CEU estar fechado”, indignou-se.

Mires foi uma entre as mais de 100 mulheres de seis bairros das periferias da capital paulista que participaram dos encontros do projeto “Desconstruindo Estereótipos”, proposto pelo coletivo Nós, Mulheres da Periferia. A exposição traz os resultados desse trabalho com fotografias, autorretratos e registros audiovisuais dessas mulheres.

“Essa exposição é uma tentativa de mostrar as nossas histórias. A grande maioria nunca havia sido entrevistada e nós temos muito o que falar”, disse Semayat Oliveira, 27, outra integrante do coletivo.

Simultaneamente, na outra ponta da cidade, mais precisamente no Calçadão Cultural e na Casa de Cultura Palhaço Carequinha, Grajaú, zona sul, acontecia o 1º Festival das Culturas Negras, com diversas atividades e atrações, como oficina de turbante, feirinha de economia solidária e apresentações de danças, capoeira e outras performances artísticas. O evento foi finalizado com o Baile Black, comandado por Nelson Triunfo, um dos precursores da cultura hip-hop no Brasil.

Serviço

Exposição QUEM SOMOS [POR NÓS]
Visitação: de 21/11 a 17/12, de terça a sábado, das 10h às 20h; domingos e feriados, das 10h às 18h.
Local: CCJ – Centro Cultural da Juventude
Endereço: Avenida Deputado Emílio Carlos, 3641 – Vila Nova Cachoeirinha, São Paulo – SP, 02720-20
Site: nosmulheresdaperiferia.com.br

Marcha da Periferia

Informações: facebook.com/marchadaperiferiaSP

***
Fonte: Mural – Agência de Jornalismo das Periferias.

 

Tags

Compartilhe:

Share on facebook
Share on twitter
Share on pinterest
Share on linkedin
Share on email
No data was found

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.

Categorias

Cadastre-se e receba nossa newsletter com notícias sobre o mundo das cidades e as cidades do mundo.

O São Paulo São é uma plataforma multimídia dedicada a promover a conexão dos moradores de São Paulo com a cidade, e estimular o envolvimento e a ação dos cidadãos com as questões urbanas que impactam o dia a dia de todos.