Os trilhos que viraram trilhas

A mais recente delas, ainda no papel e sujeita a aprovação da Câmara Municipal do Porto, vai ser, se tudo aprovado, uma beleza. Ligará a estação de Campanhã à Alfândega do Porto, ao longo da encosta que margeia o rio Douro. Pode estar nascendo mais um cartão postal da cidade. Este trecho de linha ferroviária de cerca de 4 km foi importante no final do século XIX e início do século XX, mas está desativado há algumas décadas. Se o projeto for aprovado, ganhamos uma nova pista para as pedaladas e um novo parque urbano, resultado da requalificação ambiental e paisagística.

Foto: Marcos Freire.

Foto: Marcos Freire.

Foto: Marcos Freire.

Mas não é preciso esperar para pedalar pelas rotas que eram dos vagões. Se quiser conhecer Portugal pelos caminhos de ferro, é só subir na magrela e se aventurar pelo país. Ainda não conheço todos, mas já me encantei pela Ecopista do Vouga, ainda que, infelizmente, tenha ido apenas caminhar (sim, bicicletas e pedestres convivem pacificamente pelas ecopistas). Esta ecopista tem cerca de 11 km e acompanha o Rio Vouga, passando por pequenos túneis e pela linda ponte do Poço de Santiago, uma das atrações do caminho. E vale uma paradinha na antiga estação de Paradela, também desativada, e que hoje é um gostoso café. 

Mas a maior de todas e, dizem, a mais bonita é a Ecopista do Dão, com seus quase 50 km. Ocupa o lugar dos trilhos de uma linha originalmente inaugurada no final do século XIX e totalmente encerrada em 1988. Ela atravessa os concelhos de Viseu, Tondela e Santa Comba Dão. O projeto ficou entre os três melhores na categoria Excelência, em premiação da Associação Europeia de Vias Verdes (2013). Parte da Ecopista do Dão margeia o rio Dão e o seu afluente, o rio Paiva, acompanhando a sinuosidade das águas. E pelo caminho, entre os sobreiros (as árvores da cortiça) e carvalhos, é possível avistar as serras do Caramulo e da Estrela. Já está na minha lista de desejos, com certeza.

Trecho da Ecopista Do Dão. Foto: Maria João Gala.

Mais ao norte, a Ecopista de Guimarães ocupa um trecho desativado dos trilhos que uniam a cidade à vizinha Fafe. São cerca de 15 km já prontos, mas há outros 6 km no total do projeto. No caminho, a antiga estação de Cepães – agora um bar e café – também é uma boa parada para recuperar o fôlego.

Ainda mais para cima, já praticamente na fronteira com a Espanha, a Ecopista do Minho, com seus 15 km, faz a ligação das cidades de Valença e Monção, acompanhando o Rio Minho. Ao longo do percurso, as deslumbrantes paisagens minhotas (no final, qual será a mais bonita ecopista?), aldeias, capelas, miradouros, florestas e grandes vinhedos de Alvarinho. Inaugurada em 2004, a Ecopista do Minho foi eleita a terceira melhor Via Verde da Europa.

Do campo para a praia, a Ecopista de Famalicão une o interior ao litoral, mais especificamente Póvoa de Varzim, também no norte de Portugal. Como as outras, a pista segue o caminho dos antigos trilhos que ligavam as duas cidades, inaugurados no final dos anos 1800 e desativados em 1995. São cerca de 28 km entre áreas rurais e florestas, em percurso relativamente plano. Mas para quem realmente não quer fazer muita força, o sentido interior-litoral é mais tranquilo.

A Ecopista do Rio Minho é 3a. maior via verde da Europa. Foto: Blogue do Minho.

Indo um pouco mais à direita no mapa de Portugal, outra ecovia que aparece é a do Tâmega, que liga a linda cidade de Amarante, banhada justamente pelo rio Tâmega, a Cabeceiras de Basto, passando ainda pelo município de Celorico de Basto, num total de aproximadamente 40 km. O ramal desativado em 1990 é deslumbrante. Muitas pontes, túneis, aldeias, antigas estações reformadas, equipamento da antiga infraestrutura ferroviária recuperado e, claro, o visual maravilhoso de toda a região do Tâmega. 

Do Tâmega para o Douro, outra ecopista gostosa até no nome: Ecopista do Sabor, em pleno Alto Douro Vinhateiro, num percurso ainda não totalmente finalizado, mas que permite um pedal de mais de 30 km. A antiga Linha do Sabor, inaugurada nos anos 1930 e desativada no final da década de 1980, tem mais de 100 km, de Pocinho até Miranda do Douro e já está “pedalável” em um trecho inicial até Torre de Moncorvo.

Estação de Mondim de Basto em trecho da Ecopista do Tâmega. Foto: Porto e Norte.

Uma opção mais curta é a Ecopista do Montado, na cidade de Montemor-o-Novo, distrito de Évora, na região do Alentejo. São pouco mais de 12 km a partir da antiga estação de Montemor-o-Novo até a estação de Torre de Gadanha, no mesmo município. Pelo caminho, a ponte sobre o rio Almansor, mirantes e as antigas construções também tornam o passeio muito bonito. O trecho original da via férrea esteve em operação de 1909 a 1988 e foi transformado em ecopista em 2009.

Ainda na mesma região, a Ecopista de Mora parte de Évora para Mora, também ocupando o antigo ramal ferroviário que unia as duas cidades, em um total que chegará a aproximadamente 60km (ainda há pequenas interrupções ao longo do trajeto), o que fará dela a maior do país. Sair de Évora já uma atração. A cidade é realmente encantadora e o que não falta são lugares para conhecer e delícias conventuais para experimentar antes de encarar a pedalada. O percurso ainda passa pelo Solar da Sempre Noiva, considerado um dos Monumentos Nacionais desde 1910, próximo de Arraiolos, a cidade conhecida pelos tapetes. A linha férrea foi inaugurada em 1908 e estava desativada desde 1990.

Trecho de Ecopista passa pela antiga estação de Arraiolos. Foto: Viagens à solta.

Por fim, já no distrito de Setúbal, mais perto de Lisboa, a curta Ecopista de Montijo, no trecho da ferrovia desativado em 1989, vai da estação de Pinhal Novo, na cidade de Palmela, até o município vizinho de Montijo, percorrendo cerca de 6km, de um total que deverá chegar a 10 km. Originalmente, a linha era utilizada para transporte de carga, principalmente porcos, até a estação de Montijo.  

Ainda que todas essas ecopistas não sejam integradas, é uma deliciosa maneira de conhecer o país. E quando as bikes não puderam percorrer as ferrovias desativadas, façam como eu: embarque com a magrela nas linhas em operação e rode o país. Para quem gosta de pedalar, a dobradinha bike e comboio é a melhor maneira de desbravar esse país lindo.

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Marcos Freire mora com a família em Ovar, Portugal, pequena cidade perto do Porto, conhecida pelo Pão de Ló e pelo Carnaval. Marcos é jornalista, com passagens pelas principais empresas e veículos de comunicação do nosso país. Escreve quinzenalmente no São Paulo São.

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