Por Tim Schauberg.
Para tornar as cidades mais sustentáveis, saudáveis e justas, temos que repensá-las, dizem os planejadores urbanos. Uma ideia: cidades de 15 minutos. Mas o que é realmente? De Paris a Xangai já existem abordagens interessantes.
A capital francesa, Paris, é uma das pioneiras. Depois de Carlos Moreno ter popularizado a ideia em 2016, a prefeita Anne Hidalgo incluiu o conceito de cidade dos 15 minutos em sua campanha de reeleição e começou a implementá-lo.
De acordo com as Nações Unidas, até 2050 dois terços dos aproximadamente 10 bilhões de humanos na Terra viverão em regiões urbanas. Há 15 anos a proporção de moradores nas cidades e no campo ainda era a mesma.
Uma ideia de como esse futuro poderia se tornar mais sustentável, habitável e saudável é a “cidade dos 15 minutos”
Compras, áreas verdes e trabalho acessíveis em 15 minutos
A ideia básica desse modelo é que os moradores possam caminhar ou pedalar para os locais de compras, lazer e trabalho em cerca de 15 minutos, trazendo mais qualidade de vida.
Hoje em dia, muitos nas grandes cidades só podem sonhar com isso: engarrafamentos constantes no caminho para o trabalho e conexões muitas vezes ruins no transporte público custam muito tempo e nervos em todo o mundo.
Quer se trate do caminho para o trabalho, lojas, escolas, consultórios médicos, áreas de esporte, parques, restaurantes ou instituições culturais, trata-se de “acesso para todos, a qualquer hora”, escreve Carlos Moreno, da Universidade Sorbonne de Paris, que primeiro formulou a ideia em 2016.
É um conceito que coloca os habitantes e suas necessidades em primeiro plano no planejamento urbano, uma espécie de “design centrado no ser humano”.
Para projetar cidades mais habitáveis — e sustentáveis –, os urbanistas precisam repensar: espaços verdes, áreas esportivas, cinemas ou lojas devem ser construídos onde se vive, e não o contrário, diz Benjamin Büttner, especialista em mobilidade da Universidade Técnica de Munique. Segundo ele, nem tudo precisa ser demolido e reconstruído, mas o espaço público existente deve simplesmente ser redesenhado.
Por outro lado, a cidade dos 15 minutos também está associada a um conceito de mobilidade bem definido: acima de tudo, menos automóveis e mais espaço para ciclistas e pedestres, percursos seguros para crianças, portadores de deficiência ou idosos, bem como espaços de encontro, convívio e intercâmbio.
“Os carros são um problema, pelo menos nos centros urbanos. Eles apenas ocupam muito espaço. Acima de tudo, podem dificultar a mobilidade ativa”, diz Büttner.
Paris a Xangai: cada vez mais cidades estão se remodelando
Atualmente, 16 cidades em todo o mundo já estão implementando a ideia ou conceitos semelhantes, ou planejam fazê-lo. As abordagens variam, algumas querem implementar conceitos de 20 minutos; outras, de dez minutos. Algumas se concentram primeiro em bairros individuais; em outros lugares está sendo replanejada toda a cidade.
A capital francesa, Paris, é uma das pioneiras. Depois de Carlos Moreno ter popularizado a ideia em 2016, a prefeita Anne Hidalgo incluiu o conceito de cidade dos 15 minutos em sua campanha de reeleição e começou a implementá-lo.
No coração do projeto para Paris estão as escolas como “capitais”, ou seja, os centros dos respectivos distritos. Para isso, alguns pátios escolares estão sendo convertidos em parques, aptos a serem também utilizados para outras atividades após as aulas e nos fins de semana.
Além disso, metade das 140 mil vagas de estacionamento da capital será redesenhada e convertida em espaços verdes, playgrounds, áreas para interação entre vizinhos ou vagas para bicicletas. Até 2026, todas as ruas da capital francesa deverão ser amistosas para ciclistas.
Em 2016, Xangai anunciou que introduziria “círculos de vida comunitária de 15 minutos”. No futuro, todos deveriam poder realizar suas atividades diárias em 15 minutos a pé. Outras 50 cidades chinesas também querem adotar o conceito.
Também no Reino Unido uma iniciativa visa melhorar a qualidade de vida dos moradores urbanos. O governo britânico anunciou que, como parte de um programa nacional de renaturalização, todos vão poder chegar a um espaço verde ou mar aberto a partir de seu local de residência em não mais de 15 minutos.
As “superilhas” ou super bairros de Barcelona
Barcelona, no norte da Espanha, vem experimentando há algum tempo as assim chamadas
“superilles” (superilhas), em que blocos de moradias são combinados num superquarteirão. Apenas moradores ou veículos de entrega têm acesso de carro, e 10 km/hora é a velocidade máxima permitida.
Muitas ruas são bloqueadas para carros e usadas para outros fins. Onde antes havia
estacionamentos, agora há árvores, crianças brincam e idosos sentam-se à sombra num banco de
parque, e legumes e flores crescem em canteiros elevados.
Büttner denomina essa abordagem “urbanismo tático”. Os conceitos são experimentados por dois a seis meses, “para então ver se a situação melhorou ou até piorou”. “E então ainda se pode voltar atrás. Mas, se melhorou, pode virar medida permanente.”
Atualmente, 60% do espaço público e 85% das ruas de Barcelona são usados para o tráfego. Mais da metade da população está exposta a ruído e poluição do ar bem acima dos limites estipulados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), resultando em altas taxas de mortalidade. Os novos bairros destinam-se a reduzir o tráfego motorizado em 21%. No futuro, em vez de 56%, apenas 6% estarão expostos a poluição atmosférica além dos valores-limite.
Falta de tráfego prejudica os negócios?
Abdicar do carro no dia a dia significa economizar dinheiro. As cidades que investem em ciclovias, calçadões, transportes públicos e espaços verdes são também mais interessantes para o turismo e atraem visitantes.
Estudos mostram que andar mais de bicicleta e caminhar reduz os gastos públicos, porque comunidades e municípios gastam menos na manutenção de estradas e no setor de saúde pública. A Associação Europeia de Ciclistas estima os efeitos positivos do ciclismo em mais de 90 bilhões de euros, só na União Europeia (UE). O tráfego motorizado, por outro lado, exige mais de 800 bilhões de euros em gastos com saúde, meio ambiente e infraestrutura por ano.
Muitos comerciantes estavam céticos inicialmente, por temerem uma queda das vendas se os clientes não pudessem mais fazer compras motorizados. Na verdade, eles também podem se beneficiar da cidade dos 15 minutos.
Um exemplo é Portland, nos Estados Unidos, onde o tráfego de carros diminuiu 20%. Ao mesmo tempo, o comércio local lucrou US$ 1,3 bilhão a mais, porque pedestres e ciclistas compram com mais frequência.
Conceitos de 15 minutos variam
Para que o maior número possível se beneficie com a mudança e não haja ameaça de novas desigualdades e aristocratização, especialistas enfatizam a importância de uma mistura social nos bairros e a inclusão do maior número possível de partes da cidade.
Isso também requer um repensar dos regulamentos de uso e categorias clássicas de planejamento, como centro urbano, área residencial, subúrbio, áreas comerciais e periféricas, fatores que contribuíram para a desigualdade e exclusão social nas cidades de todo o mundo.
Segundo Büttner, o que é preciso acima de tudo é vontade política e coragem por parte dos tomadores de decisões e das administrações — e um diálogo próximo do povo com todos os envolvidos.
Não existe uma solução única para todas as cidades. Cada lugar, a estrutura social, econômica e ecológica de cada cidade é diferente, enfatiza Büttner. E, dependendo do contexto, deve-se decidir quais medidas são mais adequadas.
***
Artigo publicado originalmente na Deutsche Welle.