Sob curadoria de Adriano Pedrosa, diretor artístico do museu, e Tomás Toledo, 13 artistas apresentam distintas facetas do trecho mais icônico da cidade. A ideia é simples: esmiuçar a história e vivências contemporâneas da avenida que abrigava os barões do café e burgueses, mas que se transformou em um centro comercial e palco de manifestações políticas e sexuais, além de concorrido espaço de lazer.
O olhar dos criadores nos revela mais sobre esse cartão-postal: Marcelo Cidade aponta para o comércio paralelo já oficial e a complexidade de suas estruturas; André Komatsu direciona a atenção para as calçadas, propondo uma união de tempos; Cinthia Marcelle também atenta para baixo, buscando o lixo e os refugos; Daniel de Paula pesquisa os significados físicos e filosóficos do alto consumo de energia na região; Ibã Sales enfoca a visão dos índios Kaxinawá sobre o lugar; e Rochelle Costi leva os artistas de rua para dentro do museu.
Confira alguns dos projetos desenvolvidos para a mostra.
Lado B
Conhecido por usar estética e referências da ficção científica para reescrever a realidade, criticando-a com a esperança de mudanças, Luiz Roque ficou incumbido de retratar o submundo da região: são gays, prostitutas, drogados e todas as tribos urbanas que ali sofrem discriminação e até violência. Ele explorou o subsolo da Paulista como uma metáfora para falar de parcelas apartadas da sociedade. O metrô foi, assim, locação para o filme S, uma história pós-apocalíptica. “Será sobre uma sociedade que vive no metrô, composta por negros afeminados, e que não pode subir pois a avenida está muito quente. É possível, no entanto, fazer um treinamento para um local bastante refrigerado – o shopping, um‘paraíso’ para os abastados”, conta. A crítica a situações absurdas que acontecem no endereço aparece sutilmente. É o caso da cena da aula de defesa pessoal em que lâmpadas se tornam espadas (não é uma referência a Star Wars, e, sim, ao ataque que um jovem sofreu em 2010 com duas lâmpadas fluorescentes).
Balé da violência
Os conflitos e manifestações aparecem de forma explícita no trabalho de Dora Longo Bahia. Depois de criar séries que apontam para diversos tipos de violência e para o ativismo Black Bloc, a artista selecionou seis cenas de agressão em passeatas na avenida para pintá-las no verso de cada tela – elas ficarão nos cavaletes de Lina Bo Bardi, entre as obras do acervo. “Busquei imagens que tivessem movimento [ao olhá-las lado a lado é possível imaginar uma dança trágica] e que mostrassem um estado de desigualdade, pois é sempre um cidadão desarmado contra vários policiais prontos para uma guerra”, afirma. E a frente das telas? Serão todas brancas. Dora queria pintar o rosto dos presidentes das seis instituições culturais da Paulista – Masp, Fiesp, Itaú Cultural, Sesc, IMS e Safra –, mas eles não se sentiram confortáveis com a exposição. As obras serão apresentadas, portanto, inacabadas, embora os nomes deles estejam nos títulos das telas junto à data da manifestação.
Coreografia aérea
Interessada pelo skyline da Avenida Paulista – formada pelas antenas e helipontos – e pelo tráfego aéreo da região, Ana Luiza Dias Batista vai promover uma performance impactante, com camadas de interpretação. No domingo 19, cinco helicópteros pousarão – em momentos diferentes e de maneira discreta – em helipontos espalhados entre a Fnac e a esquina com a Al. Ministro Rocha Azevedo. Num dado momento, eles subirão até a altura do topo das antenas e permanecerão imóveis, em rotação mínima. “O helicóptero parado é associado a algum evento estranho ou tenso no chão”, diz. O clima de interrogação que ela pretende criar traz, ainda, referências de filmes de ficção científica. “Os OVNIs sempre pairam sob nós ou andam devagar. Isso gera uma atmosfera de dúvida: o que eles vão fazer?”No segundo momento, as aeronaves desfilarão sobre os pedestres no sentido da Consolação. Há, aqui,uma lembrança das paradas militares – não menos amedrontadora que a chegada de extraterrestres ou da polícia durante uma manifestação contra o aumento da passagem de ônibus ou mesmo de fatos violentos durante a parada gay.
Janela da alma
Mestre em retratar a arquitetura moderna e seus desdobramentos ou até falência (pense na série feita na posse de Lula em 2002), Mauro Restiffe não se deixou seduzir pelas transformações urbanísticas e arquitetônicas da principal via da cidade, como se esperava. Ele resolveu revelar uma versão pouco conhecida e intimista: a Paulista residencial. Pediu permissão para entrar na casa de 30 moradores e, em uma única tarde, registrar seu cotidiano, sua personalidade e a perspectiva em relação a Paulista – visual e ideológica. “Poucos lembram que existem pessoas que, de fato, moram ali. Eles vivem entre os edifícios comerciais e convivem com os eventos públicos cada Vez mais frequentes”, relata o artista. “Minha ideia era também resgatar as características e a situação do retrato: no passado, as pessoas abriam a casa para serem fotografadas”, continua. Eram registros privados para álbuns e documentos, que podem aparecer, aqui, em tempos suspensos.
A exposição no MASP será dividida em duas partes, o Núcleo Conteporâneo, com artistas que realizaram novos projetos sobre a avenida e seu entorno e o Núcleo Iconográfico, com aqueles que já pensaram e retrataram a avenida em trabalhos passados – confira alguns deles a seguir!
Serviço
Avenida Paulista
Museu de Arte de São Paulo – MASP.
Período: 17.02.2017 a 28.05.2017.
De terça a domingo.
Horário(s) 10h às 18h (quinta até às 20h).
Avenida Paulista, 1578, Centro.
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Por Beta Germano na Casa Vogue.