Da Praça da Sé ao Anhembi, 5 lugares importantes para a história do samba em São Paulo

Além da velha guarda, existem ruas, praças e esquinas em São Paulo que guardam uma história pouco contada. Do samba que saía da lata dos engraxates e de caixas de feiras. Descubra abaixo a importância de cinco locais da paulicéia importantes para a história do samba paulista.

Largo da Banana

No começo do século XX, o Largo da Banana era a região cerealista de São Paulo. Pela Estação Barra Funda de trem chegavam os carregamentos de cereais e frutas, como bananas, que deram o nome à região. Homens, principalmente negros, que não tinham trabalhos formais nas indústrias da região, faziam bicos carregando e descarregando as caixas, contou o sambista e sociólogo Tadeu Kaçula.

“Quando não tinham clientes eles armavam ali a roda de samba, exatamente embaixo desse viaduto, que hoje é o Viaduto do Pacaembu”, explica Kaçula. O viaduto do Pacaembu foi inaugurado em 1959, o que foi cantado na música do sambista Geraldo Filme: “Vou sambar noutro lugar”. A letra diz: “Surgiu um viaduto, é progresso/ eu não posso protestar/ Adeus, berço do samba/ eu vou me embora/ vou sambar noutro lugar”.

O extinto Largo da Banana hoje abriga o Viaduto do Pacaembu e o Memorial da América Latina. Quem passa pela região não imagina que ali rodas de samba reuniram importantes compositores como o Tio Mário, da Vila Carolina, e Pato N’Água. “O marco zero do samba paulistano, por assim dizer, é exatamente aqui [viaduto do Pacaembu]”, define Kaçula.

Na mesma região, na Barra Funda, foi criado em 1914 o cordão carnavalesco “Grupo Barra Funda”, por Dionísio Barbosa. Depois, liderado por Inocêncio Tobias, o cordão passou a se chamar Cordão Camisa Verde e Branco. Após o carnaval de 1972, o cordão se transformou na escola de samba que veio a ser uma das mais tradicionais de São Paulo. Apesar de não ganhar um título desde 1993, o “verde e branco” é a terceira escola com mais títulos do carnaval paulistano, atrás da Vai-Vai e da Mocidade Alegre.

Baixada do Glicério

Na Baixada do Glicério, na região central de São Paulo, há um lugar conhecido como Cinco Esquinas, na união da Rua do Lavapés com a Rua da Glória. Ali, nos anos 30, sambistas se encontravam para fazer rodas de samba.

O sociólogo T. Kaçula explica que a região passou a reunir a comunidade negra que antes morava no bairro da Liberdade. Com a imigração japonesa, famílias negras se mudaram para o bairro, iniciando um novo ciclo de samba na cidade.

Lavapés é a escola de samba mais antiga em atividade em SP. Foto: Acervo José Madre e Dona Lúcia Madre)Assim, foi fundada em 1937 a escola de samba Lavapés, pela Madrinha Eunice, na rua do bairro que leva o mesmo nome. “Uma mulher que vem do interior de São Paulo, de Piracicaba, negra, e que em 1937, pleno Estado Novo de Getúlio Vargas, ela funda a escola de samba aqui nessa região”, conta Kaçula.

“A Madrinha Eunice leva o nome de Madrinha Eunice porque ela de certa forma fazia o papel de madrinha de todas essas crianças que viviam aqui. (…) Trazia essas crianças, esses jovens, para dentro da escola de samba”.

Nas décadas de 50 e 60, a Lavapés chegou a ganhar sete vezes o carnaval de São Paulo. Hoje, desfila no grupo 3 da União das Escolas de Samba Paulistanas (UESP).

Praça da Sé

A Praça da Sé é conhecida por abrigar um dos cartões postais da cidade, a Catedral da Sé, um dos maiores templos góticos do mundo. O que poucos sabem é que ali, nas décadas de 40 e 50, rodas de samba eram protagonizadas pelos engraxates da praça, que batucavam nas suas latinhas de graxa.

“Os engraxates de São Paulo se encontravam para fazer suas rodas de batuque e sobretudo fazer a tiririca, que para quem não sabe o que é tiririca – é uma espécie de capoeira sambada onde eles formavam a roda, um sambista plantava no meio e os outros sambistas em volta sambavam e davam pernadas pra derrubar o sambista que estava plantado. Então, o sambista bom era aquele que se mantinha em pé”, explica o sociólogo Tadeu Kaçula.

Germano Mathias participava das rodas de samba na Praça da Sé tocando latinhas de graxa. Foto: Divulgação.

Na praça se reuniam sambistas como Toniquinho Batuqueiro, Seu Silval do Império do Cambuci, Carlão do Peruche e Germano Mathias. “Se encontravam aqui nessa região da Sé pra poder fazer o batuque paulista, para poder fazer a roda de tiririca que é essa genialidade da capoeira sambada”, conta Kaçula.

O samba da Praça da Sé também foi letra da música “Tebas”, de Geraldo Filme. “Engraxate batendo a lata de graxa/ e camelô fazendo pregão/ O tira teima dos sambistas do passado/ Bexiga, Barra Funda e Lavapés/ O jogo da Tiririca era formado/ o ruim caía e o bom ficava de pé”.

Avenida São João

“Antes mesmo do sucesso de ‘Sampa’, da Avenida São João com a Ipiranga, essa avenida já foi palco de muitos enredos importantes da história do Brasil”, filosofa o sociólogo Tadeu Kaçula. Isso porque o circuito dos cordões carnavalescos de São Paulo passava pela Avenida São João.

“Cordões carnavalescos como Paulistano da Glória, Fio de Ouro, Rosas Negras, Camisa Verde e Branco, Vai-Vai, Campos Elíseos, Coração de Bronze… aqui era um circuito importante”. O perímetro do samba ia da altura da Duque de Caxias até a Avenida Ipiranga.

A formação dos cordões carnavalescos de São Paulo tinha elementos diferentes dos que conhecemos das escolas de samba, explica Renato Dias, criador do Kolombolo Diá Piratininga, grêmio recreativo que resgata e difunde o samba de São Paulo. “Tinham o baliza, as rumbeiras, a porta-estandarte e instrumentos de sopro, coisas que não existem mais nas escolas de samba”.

Cordões carnavalescos desfilavam na Avenida São João e Vale do Anhagabaú. Foto: Acervo / SRZD.

A São João que era reduto espontâneo dos foliões tornou-se em 1968 o palco oficial do Carnaval de São Paulo. O então prefeito José Vicente Faria Lima, que era carioca, disse que apoiaria o carnaval paulistano desde que os cordões seguissem algumas regras.

O apoio da Prefeitura foi aceito, já que os cordões costumavam ser reprimidos e perseguidos na cidade. Para poder viabilizar o Carnaval, as escolas e a Prefeitura concordaram em adaptar as mesmas regras do Carnaval do Rio de Janeiro. Assim, a São João passou a receber os desfiles oficiais das escolas de samba.

“E aí muda totalmente a cultura dos cordões, que era genuinamente paulista. A tradição dos cordões foi “modificada para atender um processo político que estava vigente no Brasil naquela época”, explica Renato, que é especialista na história do samba de São Paulo.

Sambódromo do Anhembi

Pérola Negra desfila no Sambódromo do Anhembi no Carnaval 2016. Foto: Marcelo Brandt/G1)

Em 1977, o desfile oficial de carnaval migrou da Avenida São João para a Avenida Tiradentes, também no Centro da cidade. Apenas em 1991 o carnaval paulistano ganhou uma casa própria: o Sambódromo do Anhembi, em Santana, na Zona Norte.

“A Zona Norte concentra de fato a maior parte das escolas de samba da cidade. Tem uma colaboração importantíssima, falando em termos históricos, de deslocamento social. Num dos principais planos diretores da cidade, a população negra é trazida pro lado de cá do rio [acima do Rio Tietê]. E com a população negra vem a expertise cultural que gerou uma série de manifestações culturais aqui nessa região”, explica Tadeu Kaçula.

Estão na Zona Norte algumas escolas como Mocidade Alegre, Unidos de Vila Maria, Acadêmicos do Tucuruvi, Unidos do Peruche, Império de Casa Verde, Rosas de Ouro e X-9 Paulistana. “Eu posso dizer que este hoje é o grande palco do carnaval de São Paulo que dá vazão para tudo aquilo que é produzido durante o ano inteiro”.

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Por Paula Paiva Paulo e Alexandre Nascimento, do G1, em São Paulo.

 

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