Por isso, é bom olhar para o número acumulado num período considerável para poder fazer comparações.
É o caso do número de mortes no trânsito em São Paulo. Por causa das mudanças das velocidades nas marginais, temos visto muitas notícias que procuram fazer comparações entre 2016 e 2017, tentando entender o que aconteceu após as mudanças e muita vezes é difícil chegar a algum diagnóstico preciso em pouco tempo.
Pois bem, já temos agora cinco meses acumulados de dados em 2017. Esse tempo já permite olharmos para o passado e fazermos uma comparação que tenha validade, para a cidade como um todo, não apenas um pedaço dela.
E o resultado, infelizmente, mostra duas realidades opostas.
Por um lado, o número de mortes no trânsito em São Paulo diminuiu um pouquinho, 2,5%, aproximadamente. Morreram menos motoristas de carros e motos em acidentes. E isso é bom! Qualquer morte evitada merece ser comemorada.
Por outro lado, para os chamados modais da “mobilidade ativa”, a realidade é outra: morreram mais ciclistas (17 contra 11 no ano passado), passageiros de ônibus (9 contra 4) e, pedestres, que representam quase metade de todas as mortes no trânsito em São Paulo.
O número de pedestres que morreram atropelados aumentou 30% entre 2016 e 2017. 192 pessoas perderam a vida nos primeiros meses de 2017. No ano passado haviam sido 148.
30% a mais.
Ou seja, parece que justamente os que mais precisam de proteção, os que andam a pé, em bicicleta, estão sofrendo mais. Essa é uma questão que precisa ser atacada já.
Há sempre uma controvérsia sobre a origem dos dados, mas esses números são obtidos pelo relatório do Governo do Estado de São Paulo para cada município, o Infosiga. Se a Secretaria de Transportes do Município de São Paulo tiver outros números, que os divulgue. É hora de enfrentar o problema e não de brigar pela primazia dos números e da metodologia.
É preciso gerar diagnósticos rapidamente e estabelecer urgentes ações corretivas. Onde estão esses atropelamentos? Quais são os pontos e horários mais perigosos? Quais são as causas dos atropelamentos? O que é preciso fazer para mudar isso já?
Além das ações corretivas, chegou a hora de termos um plano mais amplo. Há cidades no mundo que estabeleceram a Visão Zero, que visa acabar com as mortes no trânsito e estão tomando ações para isso.
No momento em que a sociedade discute a retomada de espaços públicos, a acessibilidade de pessoas com necessidades especiais, a melhoria do desenho urbano, campanhas para redução de acidentes e a presença de crianças e idosos nas ruas, não há espaço para a hesitação.
A cidade em que as pessoas morrem atropeladas sem reação de toda a sociedade não é a cidade que nós queremos.
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Mauro Calliari é administrador de empresas, mestre em urbanismo e consultor organizacional. Artigo publicado originalmente no seu blog Caminhadas Urbanas do Estadão.