A “Casa de Tolerância” da Companhia do Miolo será reaberta a partir do dia 3 de abril. Um antigo prostíbulo doméstico, localizado no Bairro da Penha, mais uma vez se transforma em cenário de um espetáculo teatral, que surpreende ao levar o público para vagar por uma casa cheia de mistérios. A Companhia do Miolo, que possui um trabalho emblemático no teatro de rua, com espetáculos como “Relampião” e “O Burguês Fidalgo”, abre as portas de sua sede novamente e reestreia o espetáculo “Casa de Tolerância” como resultado de uma intensa pesquisa com o bairro.
Criado na atual sede da Companhia do Miolo, uma casa onde antes funcionava um prostíbulo doméstico, o espetáculo é fruto de uma pesquisa do grupo que deu ênfase a CASA como elemento de uma poética necessária e urgente, a fim de tratar de um tema espinhoso e recorrente: a violência contra a mulher e contra a tudo aquilo que se levanta como força no feminino.
Com direção de Patrícia Gifford, a montagem explora questões das violências sofridas ao corpo da mulher e as intolerâncias e discriminações a tudo que seja ligado ao feminino. De forma itinerante, as atrizes convidam o público para uma travessia pelos cômodos da casa, fazendo uma fricção entre realidade e representação. Na trama, são realizadas ações de um cotidiano doméstico, que ganham outras dimensões quando colocadas em contato com narrativas sobre a memória do lugar, além de outras narrativas como a possibilidade de que alguns corpos podem ter sido enterrados ou emparedados neste local.
Através das histórias locais, o grupo encontrou outras inúmeras histórias, violentas e terríveis, como a questão do feminicídio em Cidade Juarez, no México, onde matar mulheres tornara-se uma prática recorrente. Em Cidade Juarez, estima-se que desde 1993, cinco mil mulheres foram mortas ou estão desaparecidas, apenas pelo fato de serem mulheres, e até hoje não há nenhum condenado.
Historicamente convivemos com a violência contra esses corpos femininos: mulheres, transgêneros, performers e tantos outros que ousaram exaltar o feminino. É neste sentido, que o espetáculo por meio de narrativas reais/ficcionais, busca em uma travessia por esta CASA, dar lugar a potência de vida desses corpos silenciados. Desde a exploração sexual infanto-juvenil, ao extermínio por motivações transfóbicas, os corpos à margem, vão sendo lembrados e exaltados por suas presenças insistentes pela VIDA.
Neste trabalho, o grupo convida o público para saborear uma galinhada, mote que dará vida a histórias de mulheres exploradas, violentadas e desaparecidas. A CASA, testemunha viva no bairro, devolve ao público uma arqueologia museológica, um memorial de tantas vozes silenciadas nesta condição do feminino.
Em 2015 o grupo adentrou os prostíbulos domésticos da Penha, visando iluminar a relação entre casa-teatro e vizinhança e durante o processo de criação, realizou almoços, apresentações e bate-papos com as mulheres da vizinhança. “A história da CASA, relativa à prostituição, é completamente velada! Os rastros se ocultam no bairro e na rua, nos quais ninguém quer tocar. Portanto, desvelar essas memórias, também nos torna cúmplices da vida local e nos permite de algum modo, pertencer àquele lugar. Além das apresentações, durante a temporada abriremos a CASA para atividades que visam ampliar e aprofundar o sentido de vínculo.” – explica Renata Lemes, integrante da Companhia do Miolo.
O espetáculo “Casa de Tolerância” nasceu do desejo de pesquisar a história desta casa, que desde agosto de 2011, funciona como a sede da Companhia do Miolo. Neste sobrado discreto, funcionava um prostíbulo doméstico, em um local predominantemente residencial, produzindo assim um espaço de “exceção”. Suas histórias e memórias estão intrinsecamente ligadas às experiências do bairro, quer seja revelando seus paradoxos, quer seja afirmando a existência de um mundo particular, sob os olhares curiosos de uma vizinhança pouco afeita àquelas antigas personagens.
Neste espetáculo feito só por mulheres, o grupo investe em uma narrativa que traga à tona a questão da condição feminina na contemporaneidade. O grupo convida o público para uma conversa rara, porém necessária, entre vizinhos, sobre temas olhados apenas pela superfície ou calados sob outras formas de submissão. Com o pretexto de convidar as pessoas para um almoço/mutirão de reforma da sede, as três atrizes da companhia recebem o público ao som de Lindomar Castilho. Em meio a tijolos, picaretas, comida e bebida, aos poucos, os acontecimentos da casa vão revelando o real intuito do convite.
Aos olhos do espectador a Casa é aos poucos revelada, e seu intrigante mistério desvelado: há ali uma mulher emparedada, um corpo ocultado, como de tantos e tantas. É preciso parar de remendar a casa, juntar as partes, cantar e velar tantas mortes sem túmulos.
A Companhia do Miolo reabre a sua sede e convida o público para desvendar os mistérios de sua “Casa de Tolerância”. Para participar, é necessário reservar os ingressos antecipadamente, pois apenas quinze pessoas participam de cada apresentação.
Serviço
Temporada: de 2 de abril à 1.o de maio – Sábados e Domingos – Horário: 17h.
*Nos dias 16 e 17 de abril não haverá apresentação.
* No caso de chuva, o espetáculo não acontece.
Ingressos gratuitos – Capacidade: 15 pessoas Classificação: 14 anos – Duração: 120 minutos.
Os ingressos deverão ser reservados através do telefone 11- 3871-0871.
Local: Sede da Companhia do Miolo – Rua Dr Ismael Dias, 111 – Penha – São Paulo – 03631-010.
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Informações de Luciana Gandelini – Assessora de Imprensa. Fotos: Alexandre Krug / Divulgação.