‘Luzeiros‘: nas ruas, espetáculo da Companhia do Miolo discute o esgotamento e a utopia na cidade

Nos últimos quatro anos a Companhia do Miolo desenvolveu uma pesquisa sobre esgotamento e utopia na cidade, que deram fruto aos espetáculos Taiô, Em Caso de Emergência, Casa de Tolerância e que agora culmina no novo trabalho –  Luzeiros, obra que reflete a trajetória do grupo frente às experiências diversas das ruas.

O que fazer quando a dureza da realidade nos impede de vislumbrar um horizonte? Esta foi a questão que o núcleo de criação enfrentou ao se debruçar sobre as memórias coletivas de resistência e luta, na tentativa de entender, a partir das suas próprias experiências, o esgotamento e a utopia. Para tratar da questão o grupo criou uma narrativa a partir de uma cidade devastada pela guerra, onde sobrou apenas uma mulher – que fincou raízes nos escombros, e uma menina – com ânsias de navegar. As personagens abrem o espetáculo com a pergunta: era mesmo uma cidade? 

“Foi necessário nos colocarmos nessa situação limite: não reconhecer a cidade, não reconhecer mais a realidade, a fim de encontrar possibilidades de enfrentar nosso próprio sentimento de impotência” diz o diretor da montagem Iarlei Rangel.

Na iminência do total esgotamento o espetáculo expõe a necessidade de se levantar, como se levantam as cidades: para além das trincheiras. Apresenta uma voz de duas personagens que transitam da paralisia a perplexidade, diante da vida e do outro. 

“Esse Luzeiros atravessa a nossa experiência de vida, nossa história; é um tanto a consequência de como se formaram nossos sonhos, nossas éticas e afetos; toca também nossos embates atuais mais profundos; um mergulho no fazer teatral das ruas” diz a atriz Renata Lemes. “A imagem de milhares de pessoas que se arriscam na travessia temerosa do mar à procura de outras cidades e países, nos permitiu olhar além dos cemitérios e ruinas do atual estado de coisas, e avistar pela primeira vez o mar! A poética insiste: É preciso levantar como uma cidade que se levanta! Nalgum lugar as multidões se põem tomadas de valentia! A utopia talvez inútil é urgente!” – complementa Renata. 

Parte da pesquisa de criação de Luzeiros aconteceu em um Depositário Judicial no bairro da Penha – local onde se entulham objetos diversos, que remetem tanto a história da cidade quanto às memórias das pessoas que perderam seus pertences. Foi nessa imbricação de escombros – que mistura a materialidade da cidade à vida privada – que o cenógrafo Eliseu Weide, inspirou-se para desenvolver seu trabalho. A partir da metáfora de roupas-corpos-sepultados, o artista criou uma instalação que revela – tanto nos elementos de nossa cotidianidade (guarda-roupa, geladeira, bonecas), quanto nas sobras de uma cidade (carros, torres, placas, antenas, etc.) – um emaranhado de memórias, resquícios de mulheres e homens, construindo assim um espaço liminar entre o que se esgotou e o que está por vir. A aposta é no tempo presente que se faz com o público, este que também compõe a cidade.

A Companhia do Miolo

A trajetória artística da Companhia do Miolo vem sendo norteada pelo desejo de provocar o encontro. Foi a partir desta necessidade que surgiu a decisão primeira: a opção pela Rua. O teatro carece de intervir no espaço da vida real, afetando e deixando-se afetar pela vida dos espaços coletivos da cidade. Os diversos espaços públicos da cidade são para a companhia o canal mais propício para o encontro contemporâneo. O grupo entende que o teatro pode criar fissuras, nestas ruas “de passagem”, gerar ações de resistência que restabeleçam seu sentido de encontro, reflexão, sensibilização, troca e expressão. 

A Companhia do Miolo, criada no ano 2000, iniciou sua trajetória com a criação do espetáculo “O Casamento Suspeitoso”, de Ariano Suassuna. Em 2003, levou para as ruas a obra “O Burguês Fidalgo”, de Molière, que contou com a direção de Bete Dorgam. Emergiu então a necessidade de aprofundar a pesquisa, através de uma linguagem corporal que pudesse dialogar com espaços urbanos. Como resultado dessa pesquisa, em 2004, o grupo estreou “O Doente Imaginário”, também de Molière, que contou com a direção de Cuca Bolaffi e sua experiência na escola Le Coq, na investigação corporal para a rua. 

Em 2006, o grupo cria seu primeiro trabalho infantil “É de Cantar e de Brincar”, com direção de Cuca Bolaffi, realizando uma imersão nas histórias antigas da cidade de São Paulo, que resultou no Projeto “Novas Histórias de uma Velha Cidade”, contemplado pela Lei de Fomento ao Teatro. Nascia aí o espetáculo “O Largo da Memória”. Em 2008 estreia “ALICE uma adaptação urbana da obra de Lewis Carroll”. E em 2009, estreou “Amores no Meio Fio”, com direção de Gustavo Kurlat.

Em 2011, retomando a pesquisa de teatro para crianças monta “ABRE-TE CÉREBRO” e no ano seguinte, contemplado na 18º edição de Fomento ao Teatro, cria o espetáculo “TAIÔ”. Ainda em 2012, estreia “Relampião”, ambos os trabalhos indicados no Premio CPT como melhor trabalho de Rua de 2012. Já em 2013, participou do Festival de Havana (Cuba), com o espetáculo “Relampião”. Depois esteve em intercâmbio com o grupo NATA- Núcleo Afrobrasileiro de Teatro Alagoinhas em Salvador, compartilhando a experiência em teatro de rua.  Ainda em 2013/2014 contemplado pela 22ª edição de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo, criou o espetáculo “Em Caso Emergência Quebre o Vidro”.

Em 2015 estreou o espetáculo Casa de Tolerância, em sua sede, uma casa situada no bairro da Penha, zona leste de São Paulo, onde antigamente funcionava um prostíbulo doméstico. Atualmente a Cia segue com o projeto Ocupações Teatrais: Esgotamento e Utopia contemplado na 27ª edição de Fomento ao Teatro para a cidade de São Paulo, com o qual estreia o espetáculo “Luzeiros” no dia 05 de dezembro passando pela Praça do Patriarca, Vão do Masp, Pátio do Colégio e Largo São Bento. Não perca a oportunidade de conhecer este que é um dos grupos mais tradicionais do teatro de rua de São Paulo e que apresentará em lugares emblemáticos da cidade de São Paulo.

Estreia e temporada 

Dias 5, 6, 7/12 na Praça do Patriarca em dois horários às 18h30 e às 20h30.
Dia 8/12 no Vão do Masp em dois horários às 18h30 e às 20h30.
Dias 9, 12 e 13/12 no Pátio do Colégio em dois horários às 18h30 e às 20h30.
Dias 14,15 e 16/12 no Largo São Bento em dois horários às 18h30 e às 20h30.

Em caso de chuva não haverá espetáculo.

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Com informações de Luciana Gandelini / Assessora de Imprensa.

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