The Baracats

Todas de sobrenome Baracat.

As três irmãs de Garça chegaram a São Paulo em épocas diferentes.

Lili, a mais velha, em 1980, Luciana, a mais nova, em 1986 e Rosana, em 1988.

Ao final dessa década, Luciana e Lili já estavam morando no Edifício Bretagne, o quarto personagem dessa história.

Projetado pelo arquiteto João Artacho Jurado e inaugurado em 1958, o Bretagne possui características tão particulares, tão únicas e, para seus críticos, tão discutíveis, que se tornou um marco arquitetônico paulistano, tombado como Patrimônio Histórico da Cidade, em 1995.

Apesar de não estar vivendo sob o mesmo teto das irmãs, Rosana sempre estava por lá.

Assim como em “Se Meu Apartamento Falasse”, “O Inquilino”, ou em “Seinfeld”, se não possuía vida própria, já que imóveis são objetos inanimados, o apartamento de Luciana e Lili foi testemunha de histórias extremamente interessantes, protagonizadas por legiões de “degredados”, vindos de diversos lugares do país, gente que nas décadas seguintes, voluntária ou involuntariamente, ajudaria a determinar a identidade cultural da megalópole que não para e, muito menos dorme.

Naquele instante histórico, inicio da década de 90, Luciana trabalhava com Carla Pernambuco, na Futura Propaganda, do então empresário de comunicação, Mario Cohen.

Carla era assessora de imprensa da agência e Luciana, sua assistente.

Carla já planejava uma carreira diferente daquela que a trouxe à São Paulo, e ainda respondia pelo sobrenome ítalo-gaúcho Danesi e não pelo, paradoxalmente, carioca Pernambuco.

Lili era produtora, esse genérico de “faz tudo”.

De fato, Lili esteve envolvida com importantes produções na MTV, que acabava de chegar ao país, o que permitia à ela frequentar as festas mais disputadas pela “rapeize”, expressão que se perdeu no tempo, mas que define bem aquele momento complexo em que a nação aprendia a conviver com o primeiro presidente eleito por voto direto desde 1960, Fernando Collor.

Lili sempre foi muito ativa em sua devoção pelos aspectos mais vanguardistas da cidade, no que tange, principalmente, ao entretenimento noturno.

Lili possuía uma impressionante capacidade de se divertir e, em suas iniciativas baladeiras sempre podia contar com a presença fiel de um morador ilustre do Bretagne, o fotógrafo e empresário Sidney Haddad.

Natural de Palmital, muito antes do brilhante Ricardo Freire nos encantar com seus necessários relatos de viagem, Sidney já havia revelado ao mundo que, de todas as cidades que conheceu, e foram muitas, tendo morado anos seguidos em Paris, foi em Bagdá que encontrou os melhores sorvetes que provou.

Lili e Sidney eram inseparáveis, sempre à partir das dez da noite.

Carolina Ferraz que, mais tarde casaria com Mario Cohen, citado acima, era amiga de Luciana, mas quem, vez por outra abrilhantava as efemérides promovidas pelas irmãs, aparecendo no apartamento, era Cristina Moraes, secretária de Mario, na Futura e muito querida por Luciana e por seu colega de trabalho, o santista Zoca Moraes, frequentador assíduo daquela residência, em Higienópolis, que deixou saudades.

Cristina, ou Cris, é uma alagoana que adotou São Paulo, sem nunca ter esquecido suas raízes, sobretudo o belo sotaque que se ouve naquele estado do nordeste.

Aqui se casou, aqui teve seus filhos, aqui fez os amigos que a admiram tanto.

Cid Torquato, o Secretário Estadual dos Direitos da Pessoa com Deficiência e futuro titular para Secretaria correlata para o município, já era o homem bonito e encantador que é hoje.

Esse vizinho morava em um bloco diferente do das meninas e, quando não estava no apartamento delas, estava no Hilário, bar no térreo que reunia alguns visitantes que faziam uma parada obrigatória antes de subirem para uma alegre noitada na Luciana e Lili.

Visitantes ilustres e constantes como o artista plástico Roger Bassetto e o bauruense e diretor de arte, Valdir Bianchi.

O talentoso escritor que estava só esquentando as turbinas literárias que seriam reveladas mais tarde, Ubiratan Muarrek, carinhosamente chamado de Bira, era sempre recebido com festa pelas meninas e por quem lá estivesse.

Bira era, é e sempre será um gigante gentil.

O mesmo tempo que passa, é o tempo que separa, desvia, e leva as pessoas por caminhos diferentes.

Em 1995, Luciana foi para Barcelona.

Anos depois, Lili seguiu a mesma trilha da irmã caçula.

Rosana permaneceu.

Formada em zootecnia, passava períodos longos fora da cidade, mas foi ela quem manteve as “Baracats” vivas na memória de seus saudosos “habitués”.

Nesses anos todos, desde a partida de Luciana, Rosana foi o ponto de contato dela com todos os seus amigos que tinham naquele apartamento uma espécie de abrigo, uma embaixada onde tantos buscavam asilo emocional.

Se não é possível voltar-se no tempo, é possível, pelo menos fazer a Luciana voltar.

E com seu regresso, São Paulo irá melhorar de ares, sem dúvida alguma.

Quem viver, verá.

 

***
Zoca Moraes, é redator de propaganda, roteirista e contador de histórias. Conselheiro do São Paulo São, assina a coluna “Chegados“ toda semana.

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