As magrelas ganhando as pistas de Portugal

Esta semana, aproveitando o gancho da 17ª edição da Semana Europeia da Mobilidade e do Dia Europeu Sem Carros, que mobilizou quase 100 cidades portuguesas, com palestras, eventos, exposições e, claro, ruas fechadas para os carros e muita bicicleta circulando, o governo português anunciou que vai investir 300 milhões de euros em ciclovias por todo o país. Serão cerca de mais 1000 km de pistas para as magrelas, voltadas principalmente para as ligações entre cidades. A iniciativa faz parte do projeto Portugal Ciclável 2030, que pretende aumentar muito o número de pessoas que utiliza a bicicleta no dia-a-dia, principalmente para ir e voltar do trabalho/escola.

Loulé, na região do Algarve em Portugal, celebra a Semana Europeia da Mobilidade com atividades de sensibilização. Foto: D.R.

Como já escrevi por aqui, a cidade onde moro é um excelente exemplo de município que valoriza as bikes, com muitas pistas e sinalização adequada. Mas quando eu pretendo ir para a cidade vizinha tenho que encarar um acostamento em parte do trajeto. Vale lembrar que mudar de cidade por aqui não é pegar 100 km de estrada. Muitas vezes, basta avançar 15km para um lado ou para o outro e já chegamos no município do lado. Aliás, esta distância de 15km foi usada como referência para a elaboração dos projetos das novas vias exclusivas para as bicicletas.

O fato de as ligações intermunicipais não serem tão desenvolvidas como aquelas dentro das cidades pode explicar o fato de apenas 1% da população portuguesa usar a bicicleta regularmente no trajeto casa-trabalho/escola-casa, contra 7% da média europeia. Apesar de existirem vias cicláveis em muitos municípios, elas terminam nas fronteiras. E já há um número considerável de ligações planejadas que ainda não saíram do papel por falta de financiamento. As exceções, porém, confirmam que ao se criar condições seguras para o trajeto, a adoção da bicicleta tende a crescer muito. Há cidades em que as viagens pendulares estão bem acima da média do país, tais como Ílhavo (9,7%), Vagos (4,7%), Marinha Grande (3,4%), Aveiro (2,9%), Olhão (1,8%), Entroncamento e Póvoa de Varzim (1,6%) e Figueira da Foz (1,5%). Minha querida Ovar, apesar de ainda obrigar que os ciclistas peguem trechos de acostamento ao sair da cidade em algumas direções, também tem quase o triplo (2,9%) da média nacional.

Portugal vai investir 300 milhões de euros em ciclovias até 2030. Foto: Lusa.

Aqui em Ovar, aliás, um grande investimento (600 mil euros) já havia sido anunciado no meio do ano para melhorar e ampliar os cerca de 50 km de ciclovias espalhadas pela cidade. E não é só em Ovar. Uma rápida pesquisa nos sites de notícias e das câmaras municipais de todo o país mostra o quanto cada cidade portuguesa tem focado seus investimentos em promover a cultura da bicicleta. O principal hotel do centro de Ovar, por exemplo, é praticamente uma parada obrigatória para um tipo específico de ciclista que cada vez mais vem descobrir as ciclovias portuguesas. Gente que coloca os alforjes nas bicicletas e desce a partir do Porto, a pouco menos de 40 km de Ovar, mesmo dividindo, em alguns curtos trechos, a pista com os carros. Com a melhoria das ligações entre as cidades, não apenas o trânsito local das bicicletas se tornará mais seguro. Ganha a cidade, ganham aqueles que querem trocar o carro pela bicicleta nos percursos diários, ganham aqueles que curtem o cicloturismo.

 Foi inaugurada no último, 22 de setembro, Dia Europeu sem Carros, a 1.ª fase da Ecovia de Guimarães, através do programa de apoio Portugal Ciclável 2030. Foto: Vítor Oliveira / Minho.

Para participar do projeto Portugal Ciclável, 2030, as cidades devem apresentar suas propostas para se beneficiarem do financiamento de até 75% do valor total. Ou seja, o valor irá ampliar um investimento já que vinha sendo feito de forma independente pelos municípios. Serão cerca de 270 milhões de euros para aproximadamente 90 ciclovias unindo municípios e mais 30 milhões de euros para ciclovias em localidades isoladas, totalizando 110 novas pistas interligando cidades portuguesas nos próximos 12 anos. As novas ciclovias podem aproveitar os trajetos já abertos por antigas linhas ferroviárias inoperantes, o que as tornará não apenas funcionais, mas também muito bonitas. Um importante requisito para os projetos é que eles priorizem a ligação com as infraestruturas já existentes da rede de transportes públicos e passem por pontos geradores de tráfego relevantes.

Ovar investe 630 mil euros para alargar uma ciclovia e construir mais três. Foto: Ciclovia PT.

O anúncio foi feito pelo Ministro do Meio-Ambiente, com uma importante mensagem: “os portugueses deverão encarar a bicicleta como um modo de transporte e não um brinquedo. O espaço público não deve ser só pensado em função do automóvel”. Ou seja, o assunto é sério mesmo. Só me permito, senhor ministro, completar dizendo que pode não ser brinquedo, mas é para mim é uma grande diversão e um grande prazer pedalar por aqui.

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Marcos Freire mora com a família em Ovar, Portugal, pequena cidade perto do Porto, conhecida pelo Pão de Ló e pelo Carnaval. Marcos é jornalista, com passagens pelas principais empresas e veículos de comunicação do nosso país. Escreve quinzenalmente no São Paulo São.

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