Cores que vêm da alma

A frase acima foi escrita por Paul Klee em seu diário durante uma viagem à Tunísia, em 1914, e revela o ponto de inflexão da obra do artista. Até aquele momento, embora tivesse sido importante elemento em seu trabalho, a cor era vista por Klee sob a perspectiva teórica, frequentemente trabalhada com moderação, em matizes. No entanto, a partir de seu contato com a intensa luz do sol africano e com a magia das paisagens setentrionais, Klee descobre os atributos emocionais da cor, dando início a um profundo e importante trabalho de pesquisa.

A questão da cor já estava em ebulição em sua cabeça desde o ano anterior, quando traduziu o texto “La lumière” (“A luz”), de Robert Delaunay. E se, em seus primeiros trabalhos, desenhos e gravuras haviam estado mais presentes do que telas, a nova relação com a cor impulsiona agora a pintura a óleo de Klee – a técnica o permite realizar diversos experimentos cromáticos, e rediscutir e reinterpretar a teoria de Delaunay. É um momento chave para a Arte Moderna.

'Parc pès de Lu' :: Paul Klee :: 1922 . Imagem: ©Zentrum Paul Klee.

Nascido em 1879 em Berna, na Suíça, filho de um professor de música e uma cantora (ambos alemães), Paul Klee teve contato com as artes desde muito cedo – aos sete anos começou a tocar violino e aos oito, a desenhar – e continuou igualmente atrelado à música e às artes visuais até perto dos vinte, quando ingressou na Academia de Belas Artes de Munique. Talentoso e sensível, dedicou-se ainda, e por toda a vida, à literatura e à escrita, tendo produzido desde registros pessoais até textos filosóficos, teatrais e poéticos (o que, sem dúvida, colaborou para sua importante obra em Teoria e Estética da Arte).

Embora tenha transitado por movimentos como cubismo, expressionismo, surrealismo e construtivismo, foi sua “redescoberta” das cores que o levou ao abstracionismo, movimento do qual, juntamente com Wassily Kandinsky, é considerado precursor. Foi a partir da viagem à Tunísia que, aos poucos, suas composições foram se tornando mais abstratas e as linhas, mais livres; os títulos das obras passaram a refletir experiências e vivências pessoais; surgiram frequentes referências à cultura oriental (que ele estudou profundamente), à poesia, aos sonhos e à música. Klee foi transformando sua obra em uma poética singular e única.

'Danses sous l'empire de la peur' :: Paul Klee :: 1938. Imagem: ©Zentrum Paul Klee.

Inovador em seus métodos e técnicas, Klee trabalhou com inúmeros materiais, muitas vezes combinando-os em uma só obra. Usou tinta a óleo, mas também aquarela, nanquim, grafite, caneta, verniz, carimbos, tela, estopa, tecidos, papel-cartão, papéis de parede, papel-jornal, recortes, colagens e carimbos, unindo tudo de maneira inédita e particular. Grande parte de seu trabalho reflete seu humor seco e seus ânimos variados; alguns expressam convicções políticas. E todos carregam, além da sofisticação cromática, a beleza que vem da verdade: aquela que une estética e ética.

Paul Klee será objeto de uma grande exposição a partir desta quarta-feira, 13 de fevereiro, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em São Paulo. Concebida especialmente para nosso país por Fabienne Eggelhöfer, curadora-chefe do Zentrum Paul Klee, na Suíça, a mostra “Paul Klee – Equilíbrio Instável” é a maior sobre o artista já exibida na América Latina, e traz 123 obras de diversos períodos de seu trabalho. São 16 pinturas, 39 papéis, 5 gravuras, 5 fantoches e 58 desenhos produzidos entre o final do século XIX e o início do XX, além de diversos objetos pessoais.

Paul Klee em foto de 1922. Foto: Getty Images.

Depois da temporada em São Paulo, que termina em 29 de abril, a mostra segue para o Rio de Janeiro e para Belo Horizonte.

Serviço

‘Paul Klee – Equilíbrio Instável’
De 13/02 a 29/04.
De quarta a segunda, das 9h às 21h.
CCBB SP: Rua Álvares Penteado, 112, Centro, SP.
Telefone (11) 3113-3651.
Entrada franca.

Visitação com hora agendada:

Opção de visitação com hora agendada pelo aplicativo “Eventim” (Apple Store e Google Play) e em culturabancodobrasil.com.br ou na bilheteria do CCBB, mediante disponibilidade.

***
Valéria Midena, arquiteta por formação, designer por opção e esteta por devoção, escreve quinzenalmente no São Paulo São. Ela é autora e editora do site SobreTodasAsCoisas, produtora de conteúdo e redatora colaboradora do MaturityNow.

 

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