‘Dia do Saci‘: versão de luxo do clássico de Monteiro Lobato tem ilustrações originais

Gorro na cabeça, uma perna só e cachimbo na boca, o personagem do folclore ganhou um dia só pra ele há pouco tempo: menos de uma década, como uma tentativa de valorizar histórias e lendas brasileiras frente aos monstros e bruxas do Halloween norte-americano.

Só que o escritor Monteiro Lobato já fazia isso há quase cem anos. O pai da literatura infantojuvenil brasileira e da turma do Sítio do Picapau Amarelo publicou em 1921 “O Saci”, livro que de certa forma recuperou a figura desse moleque travesso de uma perna só, naquela época restrito à cultura popular e aos causos do interior e das zonas rurais do país, longe dos livros, das escolas e das cidades.

Se eram só os meninos que andavam de pés descalços na roça que conheciam o Saci naquela época, então ninguém melhor para resgatar esse folclore do que o Pedrinho. O garoto inventado por Lobato para as aventuras do Sítio do Picapau Amarelo, que saía da cidade para passar temporadas na casa de Dona Benta, resolve em “O Saci” superar o medo do traiçoeiro diabinho e caça uma dessas criaturas, aprisionando-a em uma garrafa.

A editora Biblioteca Azul lançou em 2016, uma versão de luxo da história, com capa dura e ilustrações originais das primeiras edições do livro. Fazem parte, por exemplo, os desenhos de Voltolino, que ilustrou o primeiro livro infantojuvenil de Monteiro Lobato, “A Menina do Nariz Arrebitado” (1920), e que é considerado um dos grandes intérpretes do universo criado pelo escritor. Compõem a obra também os traços de Jean Gabriel Villin (que abre este texto), J. U. Campos e André Le Blanc – a maior parte, desenhos mais clássicos, feitos em preto e branco e em ponta de caneta, o que ajuda a dar o ar especial da obra.

Especialista em sacis

Lobato era um verdadeiro especialista em Sacis. Desde criança, quando ouvia as histórias do personagem na fazenda de seu pai, o moleque de uma perna só rondava sua cabeça. Tanto que, em 1916, ele já refletia sobre a ausência do folclore nacional no nosso dia a dia e escreveu na “Revista do Brasil”: “Pelos canteiros de grama inglesa há figurinhas de anões germânicos, gnomos do Reno, a sobraçarem garrafas de ‘beer’. Por que tais niebelungices, mudas à nossa alma, e não sacys-serêrês, caaporas, mães d’água, e mais duendes criados pela imaginação popular?”

No ano seguinte, ele lançou uma pesquisa no vespertino do jornal “O Estado de S. Paulo” sobre o Saci, que foi um estrondoso sucesso entre os leitores, muitos dos quais passaram a enviar causos para o jornal de encontros com o personagem ou lendas que ouviram na família. Em 1918, Lobato selecionou 74 desses depoimentos e os reuniu no livro “O Sacy-Perêrê: Resultado de um Inquérito”.

O rico material serviu de base para a primeira edição de “O Saci”, com a turma do Sítio do Picapau Amarelo, lançada em 1921. O sucesso do livro infantojuvenil foi tanto que, até 1944, a história tinha vendido 60 mil exemplares, que ajudaram a espalhar o personagem do folclore ainda mais pelo Brasil

Quer dizer, personagem do folclore é o que dizem alguns. Porque existe gente que jura de pé junto que já viu Saci dando seus pulos e rodopiando em redemoinhos por aí. Existe até uma Sociedade dos Observadores de Sacis no país.

E a coisa ficou tão séria que 31 de outubro virou o Dia do Saci. A comemoração não é oficial no país inteiro. Os projetos de lei que instituiriam a data nunca avançaram no Congresso Nacional. O que não impediu, porém, que algumas cidades criassem a comemoração. Em 2004, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) promulgou a lei que institui a data em todo o Estado de São Paulo, muito por causa da cidade de São Luiz do Paraitinga (a 171 km da capital), considerada a “capital do Saci” e que promove um festival sobre o personagem em outubro.

O Saci

Autor: Monteiro Lobato.
Editora Biblioteca Azul.
Preço: Sob consulta nas livrarias (2016; 208 págs.).
Leitor: avançado.

***
Por Bruno Molinero em seu blog na Folha de S.Paulo.

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