Em ‘Ferrugem’, um tema contemporâneo indigesto e necessário

As redes sociais e a hipervalorização do mundo virtual só fez transbordar a indigestão que está sendo ruminada não é de hoje, sem que tenhamos coragem de enfrentá-la com a consciência de que somos todos cúmplices das situações escancaradas na produção concebida e dirigida por Aly Muritiba.

A obra é de ficção, contudo poderia se encaixar perfeitamente num documentário, de tão verdadeiras que são mostradas as pessoas em suas vivências superficiais no cotidiano.

Na primeira parte o filme expõe os comportamentos banais e até inconsequentes dos jovens de uma escola privada de classe media alta duma cidade passível de estar cravada em qualquer lugar do Brasil e do mundo, dado que certas atitudes sociais são reproduzidas quase que integralmente em qualquer ponto do planeta, porque o viver vem se constituindo, cada vez mais, a partir do que se vê publicado nos smarphones.

Em um piscar de olhos, a vida de Tati (Tiffanny Dopke) é virada de cabeça para baixo; popular em um dia e vitimada no outro por todo o colégio por causa do vazamento de um vídeo íntimo viralizado pelo Whats App. Desesperada e cada vez mais fragilizada, a jovem entra em uma espiral sombria que pode culminar em um ato de violência. Neste segundo momento da fita, Tati lida com as consequências, as responsabilidades, as angústias e as distintas maneiras de se encarar a fatalidade que fugiu de controle.

Tudo é cinza e frio em “Ferrugem”: os ambientes, a falta diálogos entre pais e filhos; a inexperiência da direção da escola para de enfrentar o caso de violência digital, e a incapacidade dos jovens alunos em medir o ônus de decisões impulsivas e movidas por sentimentos confusos, oriundos de relações frágeis.

Em um piscar de olhos, a vida de Tati (Tiffanny Dopke) é virada de cabeça para baixo. Foto: Divulgação.

Dirigido por Aly Muritiba e apresentado no Festival de Sundance, o thriller explora os efeitos negativos produzidos pelas redes sociais na psique e na privacidade dos jovens contemporâneos. Temas como medo, insegurança, amadurecimento e misoginia estão no centro deste suspense social, elogiado pela crítica internacional.

A personagem mais centrada da história é a de Raquel (Clarissa Kiste), que decidiu dar novo rumo à sua vida depois de se dedicar por mais de 17 anos aos três filhos e ao marido Davi (Enrique Diaz). Em função disso ela é hostilizada pelo filho mais velho Renet (Giovanni De Lorenzi), que insiste em não atender as suas ligações.

Grávida e consciente de suas decisões, ela se impõe perante o ex-marido, e não apenas reconstrói os vínculos com os filhos, mas ensina para o primogênito Renet que na vida é imprescindível ser verdadeiro e assumir as consequências pelos atos, mesmo que isso signifique enfrentar a polícia e a justiça.

Essa postura firme, sincera e, ao mesmo tempo, amorosa, é um fio iluminado que, talvez, represente um alento ou um dos caminhos para que sejamos capazes de mudar os rumos das nossas ações dentro e fora de casa, se quisermos colher outros frutos daqui para frente como sociedade. Por aqui, fico. Até a próxima.

Serviço

Ferrugem
Nacionalidade: Brasil.
Direção: Aly Muritiba.
Elenco: Enrique Diaz, Clarissa Kiste, Tifanny Dopke, Giovanni De Lorenzi, Pedro Inoue, Dudah Azevedo.
Gênero: Drama.
Duração: 1h45 minutos.

Assista o trailler: https://www.youtube.com/watch?v=iaiFy9lvEEw

***
Leno F. Silva é diretor da LENOorb – Negócios para um mundo em transformação e conselheiro do Museu Afro Brasil. Escreve às terças-feiras no São Paulo São.

 

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