Enquanto o MoMA, em Nova York, acaba de comprar uma série dessas imagens para seu acervo, São Paulo verá agora o avesso dessa sua austeridade metálica. Dezenas de fotografias coloridíssimas do artista, grande parte delas feitas para vender carros, fogões, LPs ou anunciar liquidações, vêm à tona agora numa retrospectiva no Sesc Bom Retiro.
Fúria Capitalista
“É a primeira vez que eu faço isso”, diz o fotógrafo. “Queria mostrar as fotos coloridas que nunca foram mostradas.”
Juntas, essas imagens inéditas ou pouco vistas documentam de forma indireta a fúria capitalista por trás do crescimento da cidade que tanto atraiu o olhar de Lorca, ou seja, eram sonhos de consumo que povoariam túneis, avenidas e estradas de ferro.
Estão ali os carros, elegantes Aero Willys ou os Renault Dauphine, pilotados por senhoritas como Bibi Ferreira, Maria della Costa e Eva Wilma. Também estão lá os fogões em cores saturadas para compor interiores modernos.
Mais surreal, uma delas mostra um Jeep carregando uma girafa. Lorca lembra a loucura que foi fazer a foto no centro da cidade –irritado, o bicho fugiu e foi dar uma volta pelo vale do Anhangabaú.
Entre uma e outra campanha, o artista fazia experimentos coloridos –da mesma forma que usava o tempo livre na era em preto e branco para criar suas imagens mais icônicas, como aquela em que pôs o filho e a avó diante da Oca no parque Ibirapuera em construção, como se fitassem um disco voador caído do céu.
Em cores, Lorca flagrou um colchão de ar vermelho flutuando na superfície azulzíssima de uma piscina, o reflexo das torres do World Trade Center na carroceria arredondada de um Jaguar deslizando pela rua e as luzes de Nova York enfeitada para o Natal.
“É impressionante como eles iluminam a cidade toda [Nova York]”, diz Lorca. “Então eu remontei essa imagem para dar mais força e mais confusão.” Ele fala das duplas e triplas exposições que costuma fazer, multiplicando os pontos de vista numa mesma imagem para criar sombras e brilhos insuspeitados, imitando o enxame de luzes das grandes cidades.
Nova York e São Paulo são os lugares mais fotografados. Na mostra, uma visão da capital paulista em que os prédios parecem se multiplicar surge contraposta a Manhattan retratada do mesmo jeito, um paredão de aço e vidro colorido.
Sobre German Lorca
O artista nasceu em São Paulo, no ano de 1922, formou-se em Ciências Contábeis pelo Liceu Acadêmico, mas deixou a contabilidade por uma nova paixão, a fotografia. Em 1949, participou do Foto Cine Clube Bandeirante (FCCB), associação de fotógrafos que introduziram novas tendências na fotografia. Registrou a paisagem da cidade de São Paulo, em especial os locais da região central, como a Praça da Sé. Abriu estúdio próprio em 1952. Em 1954, foi o fotógrafo oficial das comemorações do IV Centenário da Cidade de São Paulo, com fotos que ficaram conhecidas por capturarem ângulos inusitados de políticos e personalidades da época, como Getúlio Vargas, Jânio Quadros e Orlando Villas-Boas.
Serviço
Exposição Fotográfica Arte Ofício / Artifício
Abre qui. (27), às 19h.
De 27 de outubro a 26 de fevereiro de 2017.
De terça a sexta, das 9h às 20h; sáb., 10h às 20h; dom., 10h às 18h.
Sesc Bom Retiro, al. Nothmann, 185, tel. (11) 3332-3600.
Grátis.
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Com informações de Silas Martí na Folha Ilustrada e Revista FHOX.