– Reparei porque você falou. Se não soubesse, diria ser produto de limpeza.
Já a empresária americana Stephanie Miller, de férias no Rio, racionaliza:
– Senti o perfume quando entrei. Se é para dar um clima tropical, deu certo.
– Na época, a proposta foi criar uma fragrância ao mesmo tempo exótica e delicada, que mostrasse a personalidade do ambiente — diz Rodrigo Quadros, gerente de marketing da Avatim. – Chegamos a um conjunto de notas cítricas, levemente frutado, em que se destaca o capim-limão, que hoje ficou associado ao Copacabana Palace.
André Natal, diretora geral do hotel, confirma a associação: — Inclusive, vários clientes, de diversos países, começaram a pedir informalmente um pouco do nosso aroma para colocar em suas residências. A procura foi tanta que passamos a vender o frasco em nosso spa.
Outra indústria que percebeu o cheiro do dinheiro (ou o dinheiro do cheiro) foi a automobilística. Estamos falando do famoso cheiro de carro novo, que na verdade é a soma de odores de todas as peças que compõem o interior do carro. Na Europa, este aroma é considerado brega e, portanto, minimizado. No Brasil, é sinal de status, e tolerado até um limite mais perceptível. Ligada nas aspirações sensoriais dos motoristas, a Ceras Grand Car, de Assis (SP), lançou o perfume Carro Novo, disponível nos formatos de cartão aromatizante, líquido, spray e gel de ambiente.
– Tem muita lata-velha cheirando a zero-quilômetro – diz o dono da Grand Car, Pedro Herminio Gazolli.
Carros. O “cheiro de carro novo” é dos próprio veículo, mas há aromatizadores que imitam a fragrância – Fernando Lemos / Agência O Globo.
Os alquimistas da mercadologia do olfato se fiam em pesquisas que garantem a influência de certas fragrâncias sobre o cérebro humano. Dizem estudos que o perfume certo pode projetar familiaridade em um apartamento à venda, fazer o tempo passar mais rápido no banco e até convencer você de que suou mais na academia. Verdade ou não, segundo estimativas da Scenterprises, é um mercado global de US$ 200 milhões, que cresce 10% ao ano.
Não há estimativas para o Brasil, mas o setor conta com várias empresas nas maiores capitais. A Cheiro Bom, de São Paulo, atende desde grandes lojas de departamento como a Renner (descrição olfativa: “toque fresco e leve, combina acordes florais e cítricos”) a hospitais como o Albert Einsten (“delicada fragrância que relembra a infância”). Yasmin Esperanza, gerente de marketing da Cheiro Bom, é filha dos fundadores Ricardo e Lilian. Ela comenta:
– Nasci no meio de perfumes e adoro andar perfumada. Acho que todo mundo que trabalha com isso acaba ficando cheiroso também.
Clientes menores podem optar por fragrâncias preexistentes no portfólio das empresas. Tanto lojas de chocolates quanto cafeterias costumam recorrer a um aroma de café. Padarias também se perfumam — é conhecido o caso de uma rede de supermercados gaúcha cujo setor de pães é sucesso não pela farinha ou pelo fermento, mas pela instigante essência de baunilha.
Teatro Municipal. Espaço cultural aposta em cheiro de gengibre – Fernando Lemos / Agência O Globo.
– Criamos um aroma meio verde, meio cítrico e levemente doce, combinando, entre outros ingredientes, notas de gengibre branco, erva-cidreira e capim-limão – diz Rodrigo, da Avatim.
Ou seja: se o objetivo é ser classudo e carioca, capim-limão é fundamental.
Não é de hoje a união de marcas e fragrâncias no mundo da moda — no início do século XX, o estilista francês Paul Poiret já borrifava suas coleções. Hoje, o cheiro das grifes é um passaporte para a alta-costura: você não sabe quando vai poder comprar um Dior ou um Armani, mas um perfume até que rola.
Com o advento da identidade olfativa, a loja inteira ganhou cheiro – compondo, com decoração e trilha sonora, a experiência total do marketing sensorial. Na onda de Abercrombie & Fitch e Zara, marcas cariocas seguiram a tendência. Uma delas é o Cantão, que, para honrar meio século de tradição, ficou três anos desenvolvendo sua identidade olfativa com a empresa Jing. A gerente de branding Mariana Eigert explica a fragrância resultante:
– As notas de saída são cítricas, pelo lado jovem da marca; depois, vem um odor de baunilha, bem leve, lembrando o conforto das nossas roupas; no fundo, notas delicadamente amadeiradas de carvalho, musgo e pinheiro, referência ao ambiente da loja. São três pilares da marca em uma fragrância.
Moda. Marcas cariocas, como Cantão, fazem uso do marketing olfativo – Fernando Lemos / Agência O Globo.
Como em outras marcas, o perfume do Cantão é usado em eventos próprios, salpicado nos pacotes das compras on-line e está disponível em frascos.
– As clientes querem levar o cheiro da loja com elas — diz Mariana, que aprecia a fragrância, mas prefere não levar o cheiro do trabalho para casa.
Para Andreia Miron, cool hunter de moda e perfume, é natural que empresas invistam no nariz dos clientes:
– Cerca de 80% das compras são emocionais, e boa parte dessa emoção vem do olfato. É uma maneira de forjar um vínculo, acariciar o consumidor.
Dênis Pagani, do site 1nariz.com.br e consultor pessoal de perfumes, alerta para o abuso do recurso:
– Há um fascínio atual em construir fragrâncias para o público. Em um shopping, onde cada loja tem seu cheiro, há poluição olfativa, uma disputa de espaço nasal. Neste caso, a estratégia se perde no ar.
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Emiliano Urbim em O Globo.