Meus pés no chão

Uma das imagens mais associadas à ideia de liberdade é a imagem de alguém descalço. Além de parecer uma certa forma de irreverência e não-obediência a padrões estabelecidos, caminhar sem sapatos é, de fato, um ato capaz de proporcionar sensações muito prazerosas de bem-estar físico, conforto e relaxamento. As explicações são inúmeras, das científicas às místicas.

Nossos pés são estruturas complexas e repletas de terminações nervosas que se conectam, por meio de ramificações, a diversos órgãos do corpo, à coluna vertebral, à cabeça e aos membros superiores e inferiores. A prática de cuidar do corpo pelo ato de tocar e estimular essas terminações tem o nome de reflexologia e vem sendo utilizada nas culturas orientais há milhares de anos.

Caminhar sem sapatos, especialmente sobre superfícies mais irregulares (areia, pequenas pedras, grama), nos faz massagear diferentes pontos do pé e estimular diferentes partes do corpo, favorecendo o bom funcionamento do organismo e estimulando a capacidade de concentração, a coordenação motora, a mobilidade e o equilíbrio.

Outros dizem que, ao pisarmos sobre solo úmido com pés descalços, descarregamos na terra o excesso de eletricidade estática corporal acumulada, obtendo dessa forma a sensação de relaxamento.

Já os mais místicos falam que ao caminhar descalços aumentamos o fluxo de nossa energia vital (ou nosso Chi, Qi, Prana, Baraka ou Orenda, entre outros sinônimos), pelo contato direto que estabelecemos com a Terra, uma de suas fontes naturais – e o prazer que sentimos viria justamente do restabelecimento dessa conexão com o universo natural a que pertencemos.

Não sei se pela sensação de liberdade, pelo relaxamento, pela conexão com o universo ou por tudo isso junto, andar descalça é algo que me proporciona imenso prazer. E não falo apenas de caminhar sobre a areia ou a grama… Desde muito criança, tirar os sapatos é a primeira coisa que faço ao chegar em casa – e calcá-los é a última, um minuto antes de sair e já à porta. Garantir, no meu dia-a-dia, momentos com os pés no chão, é para mim um jeito simples de garantir momentos de prazer.

E isso me faz pensar que, muitas vezes, mais importante do que entender ou discutir sobre as fontes dos nossos prazeres é saber identificar essas fontes, para assim poder ampliar o espaço que elas ocupam em nossas vidas. Nem sempre importam suas origens ou a decodificação de seus processos… importa estarmos atentos às suas manifestações, garantindo que continuem vivas e presentes em nosso cotidiano.

Andar sem sapatos, tomar um sorvete, dançar, ler um bom livro, abraçar uma pessoa querida… Identificar e ampliar os nossos prazeres na vida é, na maioria das vezes, bem mais simples do que a gente pode pensar.

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Valéria Midena, arquiteta por formação, designer por opção e esteta por devoção, escreve quinzenalmente no São Paulo São. Ela é autora e editora do site SobreTodasAsCoisas.

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