Pesquisa mede o impacto do trânsito de São Paulo no ‘bem-estar’

Um “alto custo à sociedade” é cobrado quando as autoridades se omitem ou atrasam políticas públicas que busquem aliviar o problema do trânsito, escreve o economista Ricardo Campana Vale no levantamento que apresentou como dissertação de mestrado no Departamento de Economia Aplicada da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da USP (Universidade de São Paulo).

O trabalho “Os custos da imobilidade urbana em São Paulo” usa como metodologia dados da Pesquisa Origem-Destino de 2012, realizada pelo Metrô de São Paulo. Esses dados organizam informações como motivo de viagem, horários de saída e chegada, trajetos e particularidades socioeconômicas, em diferentes modos de deslocamento (transporte feito com carro, ônibus, moto, metrô, bicicleta). Também foram colhidas estimativas de distâncias dentro da cidade para diferentes modalidades de transporte por meio do Google Maps.

O pesquisador calculou que os atrasos causados pelo tráfego parado geram um “custo de bem-estar” equivalente a R$ 7,338 bilhões por ano. Por trabalhador, o prejuízo é de R$ 747 a cada ano, quase o equivalente a um salário mínimo (R$ 954, em agosto de 2018). O estudo estima ainda que 89% das viagens por motivo de trabalho na cidade são retardadas por “fricções” no trânsito.

O bem-estar na economia

Quando fala em “bem-estar”, Vale se refere à acepção usada dentro da economia. O termo se refere à satisfação sentida pelo indivíduo em relação a bens ou serviços que consome ou utiliza. Na teoria econômica, essa satisfação é chamada de “utilidade”.

A satisfação obtida de um determinado bem ou serviço é um fator de atração. “Em economia, as escolhas das pessoas poderiam ser quantificadas segundo o que é melhor para elas”, disse o pesquisador. “Entre duas opções na hora de comer, por exemplo, você vai considerar preço, impacto na saúde etc, atribuir um peso para cada item e daí decidir qual vai escolher. Tem a ver com o quanto você acha que algo vale”.

É um conceito difícil de ser medido com números. Se pudesse ser medida, a “utilidade total” traduziria uma pessoa completamente satisfeita com um bem, serviço ou atividade.

O conceito é muito utilizado em estudos de microeconomia, ramo que estuda o comportamento de indivíduos e empresas com relação à tomada de decisões em um universo de recursos limitados.

No lado oposto, está a “desutilidade”, ou seja, os efeitos prejudiciais ou danosos de uma atividade, bem ou serviço. No contexto da pesquisa, “a situação estressante e frustrante de estar parado no meio de outros veículos lentos e levando mais tempo em uma viagem do que se espera conduz à desutilidade”, explica o trabalho.

Um estudo de microdados

 No lado oposto, está a “desutilidade”, ou seja, os efeitos prejudiciais ou danosos de uma atividade, bem ou serviço. Foto: Folhapress.Várias pesquisas já tentaram medir o prejuízo causado pelos problemas de mobilidade em São Paulo. Segundo Vale, em entrevista ao Nexo, sua pesquisa difere de levantamentos anteriores por usar “microdados” e não valores médios.

“A Pesquisa Origem-Destino, em São Paulo, traz a informação para cada pessoa, em uma mostra representativa da cidade inteira”, afirmou. “Então, ela é muito mais confiável do que a gente assumir uma média para todo mundo que muitas vezes não reflete a distribuição completa de cada viagem.”

Outra diferença, explicou, é sua avaliação do valor econômico do tempo perdido no trânsito, levando em conta se a viagem era a trabalho ou não, a faixa de renda e o gênero da pessoa, entre outros fatores.

“O valor do tempo de um profissional indo trabalhar, mas preso no congestionamento, é mais alto do que de alguém da mesma profissão, que ganhe a mesma coisa, que esteja indo para o clube no fim de semana”, exemplificou. Segundo Vale, se uma pessoa ganha menos, o valor econômico de seu tempo também é considerado menor para a avaliação. Em outras palavras, é uma avaliação numérica, da quantia que se deixa de ganhar quando se está preso no trânsito (a partir dos seus rendimentos).

O levantamento também usou o Google Maps para calcular o tempo de atraso de cada viagem em relação a uma situação de trânsito livre. Por meio da ferramenta de mapas, Vale estimou o tempo que o mesmo trajeto levaria para ser completado às 5h30 da manhã.

Desacelera, São Paulo

É um conceito difícil de ser medido com números. Se pudesse ser medida, a “utilidade total” traduziria uma pessoa completamente satisfeita com um bem, serviço ou atividade. Foto: Thinkstock.Maior cidade da América do Sul, São Paulo tem uma quantidade diária média de 43,715 milhões de trajetos realizados. Foram 1.472 quilômetros de ruas congestionadas todo dia, em média, no ano de 2017, segundo dados da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego).

Nos horários de pico, das 7 às 10 horas e das 17 às 20 horas, para o mesmo percurso, as viagens costumam registrar uma taxa de atraso de 31% em comparação com horários sem trânsito. As informações também são da CET e estão contidas no estudo de Vale.

A frota de veículos no município de São Paulo foi de 4.735.229 unidades, em 1997, para  8.603.239 em dezembro de 2017. Isso equivale a um crescimento de 82%. Os números são do Detran-SP (Departamento de Trânsito do Estado de São Paulo).

Entretanto, os congestionamentos da cidade registraram queda entre 2016 e 2018. Especialistas culpam a crise econômica. A principal razão para as pessoas saírem de casa é o trabalho, que motiva 46% das viagens. A segunda é a educação, que responde por 32%.

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Por Camilo Rocha no Nexo Jornal. Edição: São Paulo São.

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