São Paulo: o desafio dos 10 anos

Selecionei algumas delas na área de Espaços Públicos e Mobilidade, que explicam uma mudança enorme de hábitos, alguns normais hoje e que seriam impensáveis dez anos atrás.

Espaços Públicos. Em 2009…

Carnaval em 2009: Bloco Nu Interessa desfilou sob chuva leve na Vila Madalena com cerca de 800 pessoas,  que compraram ingressos a R$ 50 cada; blocos paulistanos também desfilaram na Barra Funda e no Cambuci. Foto: G1.

O carnaval de rua de São Paulo era uma brincadeira para poucos, restrita a alguns bairros . Em 10 anos, o carnaval passou a atrair 4 milhões pessoas de todas as partes da cidade e do Brasil  para seus mais de 700 blocos.

A praça Roosevelt estava começando a ser reformada, acabando com a insegura e inóspita praça de concreto que existia ali. Naquele momento, nada indicava que ela iria se tornar um dos principais pontos de encontro da cidade, após a inauguração, em 2012, que atrai gente dos extremos da cidade para conversar, andar de skate, comemorar, ir aos teatros heroicos que sobreviveram à fase difícil da praça, ou não fazer nada.

A Praça Roosevelt deteriorada em 2009 antes da reforma. Foto: Raphael Falavigna

O largo da Batata ainda estava em obras. Seria reinaugurado apenas em 2013, com poucas árvores, sem mobiliário, mas com uma vontade louca das pessoas de ficarem por ali. Foram anos de movimentos coletivos, ações da prefeitura, inaugurações de bares e a constatação de que a cidade ganhou uma nova centralidade, cheia de vida e de movimento.

A Paulista Aberta era um sonho na cabeça de poucas pessoas. Depois de 2015, a ideia de ir para a avenida e passar um domingão sentado na avenida, sem a presença incômoda dos carros, virou um programa tão normal que nem pensamos mais em como era antes que o pessoal do Sampapé fizesse o movimento para abrir a avenida. Na esteira da Paulista, o Programa Ruas Abertas abre uma rua em cada bairro para os pedestres.

“Die in”: manifestação de ciclistas na Av. Paulista, em 2013, simula corpos atropelados no asfalto. Foto: Ignacio Aronovich.

São Paulo tinha 25 parques municipais. Hoje, tem 106, além de outros sete mantidos pelo Estado.

O Minhocão ainda se chamava elevado presidente Costa e Silva (hoje oficialmente é o elevado presidente João Goulart, mas ninguém liga a mínima porque todo mundo chama mesmo de Minhocão). Em 2009, já tinha virado um lugar de lazer aos domingos e feriados, mas só em 2014 o destino de virar parque ou ser demolido foi oficializado no Plano Diretor.

Intervenção do artista plástico Felipe Morozini vista do alto no Minhocão em 2009. Foto: Divulgação.

O parque Augusta era uma ideia que já estava incluída no Plano Diretor de 2002 mas ninguém sabia como fazer isso virar realidade. Hoje, depois de um acordo, a Prefeitura bancou o projeto, ofereceu créditos para as construtoras e teremos, em breve, mais um parque público no centro.

Ninguém sabia o que era um parklet ou um food truck. Eles só foram regulamentados em 2014 e hoje fazem parte da paisagem urbana.

Parque Augusta: em 2002, o Plano Diretor prevê implantação do Parque Augusta no local. Foto: Felipe Rau / Estadão.

Quase ninguém plantava nada em terrenos públicos. Depois da pioneira Horta das Corujas, em 2014, há movimento de hortas urbanas e gente plantando árvores em toda a parte.

Fachada ativa e fruição do térreo ainda não eram estimulados nas novas construções, o que só veio a acontecer com o Plano Diretor de 2014.

Mobilidade em 2009…

Vagão da Linha 4-Amarela do Metrô de São Paulo que ligava somente as avenidas Paulista e Faria Lima. Foto: Foto: Paulo Liebert/AE.

Ainda não havia sido inaugurado nem o primeiro trecho da linha Amarela do metrô (Faria Lima – Paulista, 2010) e a linha Lilás era um sonho distante. As linhas prata e ouro do monotrilho já estava causando seus estragos na paisagem e sofrendo com múltiplos atrasos. A linha prata opera com poucas estações e a ouro não tem previsão.

Não havia nenhum aplicativo de transportes. Parece que já faz muito tempo tal é a inserção dos aplicativos nos hábitos cotidianos, mas o Uber chegou a São Paulo em 2014 e só foi regularizado em 2016.

Em 2015, faixas de aviso de redução da velocidade na Avenida Olavo Fontoura. Foto: Leonardo Benassatto / Futura Press.

Chorávamos a morte de 1463 pessoas anualmente vítimas do trânsito. No ano passado, esse número caiu para 884, graças à redução de velocidade, fiscalização e um pouco de educação. A maioria das mortes continua sendo de pedestres, e quase todas poderiam ter sido evitadas se as regras de trânsito – preferência absoluta para quem anda a pé – fossem seguidas. O segundo grupo que mais morre, o de motociclistas, também explica uma mudança na cidade: a febre dos aplicativos de comida que estimulam os entregadores a não perder um segundo no trânsito, num vale-tudo para não perder a entrega.

O novo Código de Trânsito Brasileiro havia sido aprovado no ano anterior, reconhecendo pela primeira vez a primazia do pedestre e da mobildade ativa sobre os outros modais.

Inaugurado em maio de 2012, o Bike Sampa contabilizava mais de 330 mil viagens realizadas e mais de 170 mil usuários cadastrados depois de um ano. Foto: Divulgação..

As bicicletas compartilhadas ainda não tinham chegado à cidade (o Bike Sampa só chegaria em 2012) e o patinete era um brinquedo de criança e não um transporte de executivos.

A lista é obrigatoriamente incompleta e eu agradeço quem quiser mandar mais itens, mas dá conta da impressionante transformação que está acontecendo nesse período.

Uma escola de dança traz os seus professores para fora, convidando quem passa pelo centro da cidade a se juntar a eles e aprender danças de salão. Foto: Dado Galdieri / The New York Times.

Há as mudanças causadas pela tecnologia, pelas várias esferas de várias gestões, por empresas e ONGs, e há, mais que tudo, um desejo das pessoas de se reapropriarem da cidade.

Carnaval de rua de São Paulo cresce e bate o Rio em número de blocos. Foto: Rovena Rosa / Agência Brasil.

Existe um ‘espírito do tempo’ que clama por mais urbanidade, no mundo todo e em São Paulo também. A maior mudança nesses dez anos são as pessoas.

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Mauro Calliari é administrador de empresas, mestre em urbanismo e consultor organizacional. Artigo publicado originalmente no seu blog Caminhadas Urbanas.

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