A incrível geração de marcas autocentradas

Os conceitos de marketing ensinados nas escolas e que continuam sendo praticados até hoje por inúmeras marcas e empresas nasceram em meados do século passado, nos Estados Unidos. Para ser mais exata nos anos 1950, logo após a Segunda Guerra Mundial. Isso explica porque uma série de metáforas militares empesteia a indústria da comunicação, particularmente o marketing e a publicidade. Empresas e agências olham para as pessoas que compram os seus produtos como “público-alvo” e não como seres humanos.

Alvos remetem sempre a algo que deve ser atacado e nunca abordado de forma a ser conquistado com diálogo. Parte importante das campanhas digitais, principalmente de varejo, o “disparo de e-mail marketing” é outra ferramenta muito em uso e seu efeito é quase tão nefasto quanto seu nome execrável, as pessoas jogam nas suas lixeiras virtuais tão logo chegam em suas caixas postais.

 
O livro A Arte da Guerra, de Shun Tzu, é leitura obrigatória nos cursos de marketing para entender o “mercado” como se ele fosse um campo de batalha. Esse repertório teceu uma camada invisível no inconsciente coletivo dos profissionais dessa indústria e nos gestores das empresas, já que a própria estrutura organizacional das grandes companhias segue uma hierarquia bastante militar também. O resultado é que mesmo com toda a transformação da sociedade em rede que permeia esse novo século – no qual o poder e o controle que antes estavam na mão de quem emitia a mensagem foi transferido para as pessoas -, o marketing de hoje continua igual ao dos anos 1950.
 
Com raríssimas exceções a comunicação das marcas não tem conseguido captar essa mudança. Como consequência, há um enorme gap entre o que faz parte do universo das conversas e dos sentimentos dos indivíduos e o que as marcas comunicam. 

É neste contexto que um conceito tem surgido com muita força recentemente no campo das relações humanas: a empatia. 
 
Richard Sennett, sociólogo e historiador norte-americano, professor da London School of Economics, do Massachusetts Institute of Technology e da New York University, e que recentemente esteve no Brasil a convite do evento Fronteiras do Pensamento é um dos principais autores sobre o assunto. Seu último livro ‘Juntos: Os Rituais, os Prazeres e a Política de Cooperação’ (‘Together: The Rituals, Pleasures and Politics of Cooperation, 2012) explora a arte de cooperação, de viver e trabalhar com outras pessoas. Uma de suas principais contribuições é a distinção que Sennet faz entre comunicação dialética e dialógica. Em conversas dialéticas, que é a que conhecemos e aprendemos na escola, posições opostas (tese e antítese) se confrontam com o objetivo de resolver os conflitos (como uma síntese). A conversa dialógica, por outro lado, é muito mais aberta, não necessariamente buscando a meta do convencimento do outro. A troca é mais valorizada do que a resolução de conflitos, criando assim maior compreensão, empatia e sociabilidade entre as partes.
 
A empatia diz respeito a se colocar no lugar do outro, permitindo suas diferenças. Esse conceito pode parecer etéreo e distante demais de uma sociedade cada vez mais intolerante, mas exatamente por isso, faz muito sentido.
 
A boa notícia é que a indústria da publicidade já começa a colocar a empatia na sua agenda. Nesta semana, a agência FCB Brasil em parceria com a consultoria de inovação Co.R apresentaram em São Paulo um estudo sobre empatia cujo objetivo foi entender como a habilidade de enxergar o mundo com os olhos do outros cria oportunidades para uma comunicação mais próxima e que tenha mais impacto na vida das pessoas. 

Entre outras coisas, a pesquisa descobriu que o Índice de Empatia do brasileiro é alto, 70 pontos numa escala de 0 a 100. Enquanto isso, o Índice de Empatia de Marcas, nas três categorias pesquisadas – Cervejas, Carros e Bancos – é baixo, apenas 7 pontos. O que demonstra que enquanto as marcas continuarem a praticar um marketing do século passado, totalmente autocentrado permanecerão como paisagem na nova dinâmica da social e de consumo. 

Confira a íntegra do estudo da FCB e da Co.R aqui.


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Regina Augusto é sócia e presidente da GUME, agência de reputação e engajamento.

*Artigo originariamente publicado no blog ‘Marcas, Causas e Pessoas’ do Estadão.
 

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