Mini-guia Socialista Morena de sabores e esquerdismo caviar em SP

Após seis anos em Brasília, “morei” quatro meses em São Paulo no ano passado. Aproveitei para matar a saudade e experimentar lugares novos. Sou baiana, mas passei 10 anos na capital paulista, que considero também um pouco a minha cidade… Adoro. Sim, é caótica, mas eu vejo beleza no caos. Daí tive a ideia de fazer um guiazinho socialista moreno com dicas para quem for passear por lá.

Como um lugar se qualifica para ser aprovado pelo esquerdismo caviar? Ora, primeira regra: pode até custar os olhos da cara, mas tem que valer a pena. Pior restaurante/boteco para um esquerdista caviar que se preze: caro, pretensioso e com comida ruim. Cinco estrelas (ou melhor, cinco foice & martelo): bom e barato, claro. Esse negócio de pagar caro para comer mal é coisa de novo rico (ou trouxa). 

Vamos ao mini-guia (clique nos nomes para ver os endereços).

Parques

Impossível ir a São Paulo sem dar um rolé no Ibirapuera, mas só se for durante a semana. No fim-de-semana achei hiper crowdeado. Também gosto demais de andar de bicicleta no Parque Villa Lobos, mas confesso que o meu xodó é o Parque da Água Branca. Menorzinho e acolhedor, deve ser inédito no mundo: um parque com galos, galinhas, patos, gansos, pavões e cavalos pertinho do centro da maior metrópole da América do Sul… Às quintas, sextas e sábados tem moda de viola no fim da tarde, na choupana de pau-a-pique (“Casa do Caboclo”) que vende café, broa de milho, pão de queijo e bolo feitos no fogão a lenha. Tem trilhas para caminhada e uma feira orgânica às terças, sábados e domingos. Outro passeio que o paulistano, na correria, esquece de fazer é visitar o Jardim Botânico. Desconfio que muita gente nem saiba que existe um… Ideal para piqueniques com a criançada, também tem trilhas onde se pode avistar o macaco-bugio. E um orquidário lindíssimo com duas exposições anuais, em maio e novembro.

Rangos

Japas – Fui em alguns, todos bacanas, mas não achei nenhum incrível. Na Vila Madalena, o Tanuki é simpático e bem tradicionalista (nada de cream cheese por lá) e tem coisas deliciosas como a ova de ouriço-do-mar, o missoshiru com cogumelos e o carpaccio de salmão. Em compensação, o combinado “escolha do chef” veio com umas coisas bem esquisitas para nosso paladar, tipo ovo de codorna cru… Na Liberdade, o Sushi Lika vale pelo bairro e pelo ambiente. O cardápio é bem amplo e os ingredientes fresquíssimos, mas não provamos nenhum sushi que fosse excepcional. O Mori Sushi, na Água Branca, tem um ótimo sistema de rodízio onde o sushiman corta e monta as peças diante do freguês, no balcão. Vá com fome, porque é você quem diz quando é a hora de parar… Ao contrário do Tanuki, porém, a casa abusa do cream cheese, mas é só o cliente pedir que o sushiman faz do jeito que preferir. Especializado em misturar sushi com frutas, o Mori às vezes também exagera nos sushis doces, que ficam um tanto enjoativos.     
                              

Latinos – Não sei se é uma fase minha, mas os restaurantes onde mais comi coisas deliciosas em São Paulo foram os latino-americanos. Provei um ceviche sensacional, igualzinho aos de Lima, no Rinconcito Peruano, em pleno centro de São Paulo, na rua Aurora. Feito por peruanos e para peruanos, duvido que tenha um melhor na cidade. Recomendo também o arroz chaufa de mariscos (à moda sino-peruana) e, para acompanhar, chicha morada (refresco de milho preto). O Maiz, em Pinheiros, é bem bacaninha e tem a proposta de oferecer comida de rua latino-americana, mas achei tudo meio gourmetizado: se é comida de rua, quero porções generosas, bem temperadas, e não uns mini-tacos sem graça. Enfim… Muito melhor ir ao colombiano El Garage – Sabores de Mi Tierra, uma das melhores comidas que provei em minha temporada paulistana. O lugar é supersimples, uma garagem, mas a comida… Os “tacos” vêm em patacones(tortilha de banana-da-terra) ou arepas (espécie de pão de milho branco). Comi um patacón de costelinha de porco desfiada dos deuses, mini-patacones com ceviche cartagenero e empanadas colombianas. Tudo apimentadíssimo, ótimo para comer e tomar cerveja ou limonada com rapadura (papelón) . Como eles só abrem às 18h, é o lugar perfeito para um happy hour picante y sabroso com os amigos em dias quentes de verão. E, em frente ao Espaço Itaú, a Taquería La Sabrosa tem autêntica e deliciosa comida mexicana em mesas coletivas, com vista para a calçada da movimentada rua Augusta.

Empanadas – Chilenas? Argentinas? Bolivianas? Colombianas? Sei lá, só sei que adoro empanadas. As do Bar do Seu Zé, na Vila Madalena, são gostosinhas, mas achei a massa um pouco grossa demais. Ainda prefiro as empanadas do El Guatón, em Pinheiros. Sempre fui freguesa e continua igual. A qualidade de uma casa, em minha opinião, se mede pela constância: nada mudou por ali. Ainda bem. A empanada de carne é supersuculenta e é a minha favorita. Desta vez, provei ainda a de mariscos. Gostosa, mas a de carne é a original e insubstituível.

Franceses – Aqui em casa somos loucos por mexilhões à moda francesa, cozidos no vinho branco com ervas. Comemos várias vezes os moules et frites do Blu, em Perdizes, um bistrô bonitinho com cardápio variado e fusion entre as cozinhas francesa, italiana e brasileira. Meu marido também provou e adorou os mexilhões frescos à provençal (“os melhores do mundo”, segundo ele) do Arturito, da chef Paola Carosella (aquela do Master Chef). Outro francês que sempre recomendo em São Paulo é o La Tartine, que tem menu do dia e é todo fofo, decorado com bugigangas charmosas que o dono, Xavier Leblanc, baixista da banda Metrô, sucesso nos anos 1980, colecionou pela vida. Chegue cedo, porque está sempre lotado.

Carnes – Passei no velho Fuad para ver se o sanduíche de filé acebolado ainda valia a pena e aproveitei para comer uma fraldinha. Achei tudo meio oleoso demais. Mudei eu ou mudou o lugar, um boteco dos bons, desde que seu dono (o Fuad) faleceu, em 2013? Não sei. O uruguaio El Tranvía, pelo contrário, continua bastante saboroso, embora os preços sejam meio salgados… Comemos um ótimo assado de tira e, de sobremesa, panqueques con dulce de leche. Mas ficamos loucos pelo fígado de boi recheado que eles servem como entrada: macio, saborosíssimo. Da próxima vez vou pedir só o fígado com salada. Também gostoso (e caro) é o La Recoleta em Perdizes, mas o chorizo argentino que tinha no cardápio nada tinha de argentino. Fail.

China – Só fui em um, mas no melhor: o Chi Fu, na Liberdade. Se você algum dia quiser experimentar, prepare-se para ser maltratado pelas garçonetes chinesas, que aparentemente não suportam brasileiros nem fazem questão de falar nada em português. Ou vai ver é o jeito delas, sabe-se lá. Não importa, é até folclórico –e a comida é ótima. Eu simplesmente adoro camarões com salsão e a receita deles é uma das melhores que já provei, além de a porção ser generosíssima. Comem três fácil. Ah, leve dinheiro, porque o ~simpático~ restaurante não aceita cartões.

Árabe – Desta vez não deu tempo de ir comer a uzi do Halim, uma massa folhada recheada com carne de carneiro, arroz e castanhas. Sou fã. Também chegamos atrasados para devorar os Arais do restaurante armênio Carlinhos, no Pari, que já estava fechado pontualmente às 15h… Triste. O arais é um sanduíche de carne moída no pão sírio com um tempero divino. Mas a grande estrela árabe da temporada foi o libanês Casa Cury, em Perdizes. O chef, Celso Cury, prepara receitas de família: falafel, quibe, moussaka… Eu voltei perdidamente apaixonada pelo purê de berinjela com ragu de cordeiro que é chamado no cardápio de “Deleite do Sultão”, um prato criado para um imperador otomano no século 17. Digno de reis. De sobremesa, torta de ameixa fresca e amêndoas. O lugar é charmosíssimo, os preços são ótimos e tem almoço executivo, ainda mais em conta.

Frutos do mar – Eu normalmente acho que lugares imensos não são indicativos de boa comida ou bom atendimento, mas a Peixaria, na Vila Madalena, é todo o contrário. Garçons atenciosos e uma comida de primeira. O cardápio é gigantesco, mas é tudo gostoso. O balcão de frios, com polvo vinagrete, ceviches variados, vinagrete de mexilhões e outras delícias, já vale a espera, que pode ser longa nos finais de semana. E tem ainda os grelhados e pratos quentes. As caipiroscas de frutas são uma atração à parte. Misto de bar e venda, também é possível comprar peixes e frutos do mar para preparar em casa. Ou seja, é tudo fresquíssimo.

Botecos

Estive em poucos e bons. Sempre curti o bairro da Pompéia, que está cada vez mais cheio de bares e restaurantes charmosos. Numa noite quente, eu e uma amiga nos deliciamos com camarões ao alho e óleo e cerveja gelada numa das mesinhas da calçada do Catarina Bar, especializado em petiscos com frutos do mar (tem ostras frescas de Santa Catarina aos sábados). No mesmo bairro, estive no boteco e restaurante espanhol Gusta, que tem cervejas artesanais e morcillalegítima. O lugar é pequenininho, chegue cedo. O chope do Bar Léo, na rua Aurora, continua super bem-tirado, e eu amo o canapé de carne crua que tem lá para acompanhar. Melhor dia para ir ao Léo, em minha opinião: sábado de manhã. Comemos apetitosos croquetes de costela no Pirajá, cujo chope também continua cremosíssimo. No Mundial (do mesmo grupo que o Filial, o Genésio e o Genial), na Vila Madalena, fiquei curiosa com a combinação de rabada com vareniques, espécie de ravióli da cozinha hebraica, mas estava muito quente para experimentar… Da próxima vez. Para uma noite de drinques e rock’n roll, recomendo o Alberta 3, no centro. Os barmen são excelentes. Bem escondido em um beco da Vila Madalena, o Jardim das Delícias é uma loja de plantas durante o dia e à noite vira um boteco rodeado de verde onde a dona, Tharcila, serve aos clientes cervejas artesanais e comidinhas. Me pareceu o boteco ideal para surpreender alguém. E fica aberto até tarde. Quer algo mais anti-imperialista do que tubaína? Pois em São Paulo tem um bar especializado nelas, o Tubaína Bar. Não bastassem os drinques preparados com a brasileiríssima bebida, lá também se pode comer um delicioso ceviche (a dona, a jornalista Veronica Goyzueta, é peruana) e petiscos como a coxinha de feijão, o exibidinho de pernil e o de cogumelos com mandioquinha. A decoração é toda retrô, uma graça.

Pães artesanais

Não posso viver sem pães artesanais e, como não estava fazendo em casa, procurei boas opções para comprá-los. Na Vila Romana, outro bairro que amo na zona Oeste, tem duas padarias com excelentes pães elaborados com fermentação natural. A Masseria abre suas portas para os clientes apenas aos sábados, em um casarão onde se ministram oficinas para os interessados em aprender a arte de amassar (e amar) pão. Na carta, muitos pães de verdade, com grãos, sementes, castanhas… A Pain à Table, na rua Coriolano, também funciona como café e bistrô e tem ótimos pães de levain (fermento natural), além de patês e croissants crocantes e amanteigados na medida, comme il faut. O lugar é bem charmoso, ideal para um almoço ou chá da tarde com o pretê e com as amigas.

Cynara Meneses é jornalista com passagens pelo principais veículos da imprensa. Mantém e edita o blog Socialista Morena. Conheça: http://socialistamorena.com.br/

 

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