Eduardo Alves da Costa faz sinal para o ônibus elétrico no ponto que margeia o parque Buenos Aires, em Higienópolis (região central de SP). O gesto banal para pegar a linha Machado de Assis foi repetido inúmeras vezes pelo escritor, que é autor de um dos poemas mais famosos da literatura brasileira, “No Caminho, com Maiakovski”.
O circular de número 408A –que sai da rua Cardoso de Almeida, no Sumaré, e vai até a rua Machado de Assis, na Vila Mariana– é um dos cenários do novo romance do também poeta niteroiense.
“Tango, com Violino” (ed. Tordesilhas) tem como paisagem a cidade de São Paulo, que se descortina das janelas do 408A e de tantos outros ônibus, definidos como “veleiros a navegar no seco”.
Metáfora da Vida
“Decidi escrever sobre a condição de ser um homem de 70 anos. O ônibus é metáfora da própria vida, com pontos de partida e de chegada. Simboliza a vida e a morte, já que muitos não chegam ao fim da linha ou ao ponto final”, compara o autor de 78 anos, que iniciou a empreitada há sete. “Não queria um dramalhão, mas escrever com autoironia uma reflexão sobre a vida.”
Ao longo de 352 páginas, a solidão da velhice passeia pela metrópole em viagens intermináveis, nas quais cotidianamente o protagonista Abeliano, um septuagenário, vai se enchendo de vida. Não a sua, uma existência já esvaziada, mas a de tantos outros passageiros ou habitantes da megalópole com os quais esbarra nesse vaivém.
“Não tenho mais nada para fazer o resto da vida”, conclui melancolicamente o personagem, ao se jogar em aventuras e encontros inesperados no intrincado de linhas do transporte público.
Perdendo o bonde.
“Os caras já perderam o bonde”, traduz o autor, que está na mesma faixa etária de Abeliano, seu alter ego. Nas aventuras da ficção, o protagonista se faz acompanhar do amigo Teobaldo, também aposentado. Os dois vão dialogando sobre um futuro incerto e as novidades que permeiam o “maravilhoso mundo novo” do qual se veem apartados.
“Eu fico estarrecido com o que vem por aí, com a quantidade de coisas que desconheço. A verdade é que meu pequeno mundo ficou pra trás. Envelhecer não é só chegar aos 70 anos. É começar a desconhecer a realidade em que se vive”, conclui Abeliano.
Eduardo faz coro com seu personagem. “Ao envelhecer ficamos invisíveis” constata o escritor, que teve tal percepção em uma viagem a Nova York, quando tinha 60 anos e decidiu ir ao bar da moda com a mulher e uma amiga. “Ninguém olhava pra gente.”
Eliane Trindade em seu blog na Folha de S.Paulo.