#partidA o novo Partido de Marcia Tiburi

A filósofa Márcia Tiburi é foda. Simplesmente porque ela coloca a filosofia onde ela deve estar: na ação. E a tolerância e compreensão que ela tem com ideias diferentes fazem dela uma pessoa muito agregadora. Lembro que em 2012 palestramos juntas sobre o pós-feminismo no evento Rock e Filosofia no CCBB SP e discordamos em muitos pontos ao longo do debate.

A maneira elegante e inteligente com a qual ela lidou com nossas discordâncias foi tão interessante – diferente de alguns filósofos que ficam enclausurados em suas certezas estáticas, ela entende o poder da dialética para a evolução de uma ideia, de uma sociedade. É assim nas palestras dela, era assim no programa Saia Justa quando ela era uma das apresentadoras e está sendo assim com seu novo projeto que está conseguindo reunir todas as vertentes do feminismo no país. O projeto: um partido feminista, que ela chama de #partidA.  

“A ideia é que as reuniões proliferem e que as pessoas usem a #partidA como movimento feminista para construir fóruns, plataformas, ações em geral. O que a #partidA quer é empoderar mulheres para a sua participação na política institucional. Seremos um partido político para isso, ainda que esteja em aberto a discussão sobre o sentido disso.”, ela explicou. O movimento esta se espalhando de uma forma incrivelmente rápida, já está sendo marcada outra reunião em SP por pessoas que são de outras regiões da cidade, no Rio, em Porto Alegre, Goiânia. “A ideia é ainda que não existam líderes em sentido personalista, mas que as pessoas do #partidA empoderem umas às outras. Imagine poder criado a partir de diálogo em que todo mundo se autorepresenta numa metodologia dialógica. Em que cada uma cria a outra como potência. É a Revolução.” 

Me conta como foi o encontro aqui em São Paulo, acabei não conseguindo ir, to super curiosa!
A reunião no Rio no dia 25 de maio foi linda. A reunião em SP foi maravilhosa. Um clima feminista de fazer política: afetivo, generoso, colaborativo, compreensivo. Sem disputa. Foi no Espaço Revista Cult, tinha gente sentada no chão. Aliás, quase todo mundo. Ali, as pessoas falaram o que pensavam e sentiam em relação ao estado atual da sociedade e o papel político e cultural do feminismo. Havia um diálogo real. Feministas históricas como Amelinha Lemos, como Inês Castilho, como Ana Reis, Solange Padilha e muitas outras estavam ali prontas a conversar com as novas gerações. E todo mundo estava querendo conversar. Tinha gente do ABC, do interior, do Rio. E o clima geral foi de apoio à criação do Partido Feminista, ainda que haja muita consciência e, por isso, muita critica em relação à forma partido. Ao mesmo tempo, a consciência de que o poder não pode mais ficar onde está é igualmente forte. De que é preciso chegar onde o poder de decisão está, ou seja, no governo. As mulheres são sub-representadas no Legislativo e no Executivo. Também sofrem em seus partidos que são sem exceção machistas em um sentido estrutural. Somente um partido feminista pode mudar esse cenário real. 

Há muita discordância, às vezes até brigas, entre diferentes tipos de feministas hoje em dia, especialmente as duas vertentes que podemos identificar com mais clareza, as radfem e as libfem. O que você acha disso?
Eu vejo todas as formas de feminismo como social e historicamente necessárias. Acho que a existência de vertentes é sinal de que existem contradições sociais, teóricas e práticas. Não vejo que precisemos de um feminismo único, ou na forma de um pensamento único. Ao mesmo tempo, algo que une essas tendências é o feminismo como ético-política, como defesa de uma sociedade justa em que mulheres – e outras individualidades e grupos excluídos do poder – estejam inclusas. Acredito no diálogo. Como filósofa, penso que a grande contribuição da filosofia para a nossa época é justamente a proposta do diálogo. Plantar diálogo no mundo é a nossa tarefa histórica. No caso, essas vertentes opostas trazem, cada uma à sua maneira, questões sobre as quais devemos pensar. Abrir-se ao ponto de vista da outra é, a meu ver, um gesto urgente. Ao mesmo tempo, um feminismo mais tenso, mais nervoso, mais irritado, também me encanta, coisa que eu, por minha natureza, não pratico. O feminismo sempre foi voltado à singularidade e ao diálogo, mas as formas de diálogo podem ser sempre postas em discussão.

Como surgiu a ideia de um partido feminista?
Prestando atenção no lugar político das mulheres percebe-se uma histórica subalternidade. As mulheres sempre estiveram em segundo plano. Sempre foram proibidas de participar da esfera pública e do poder constituído. Sempre foram proibidas do voto e da auto-representação. Vemos que a situação das mulheres em relação ao poder e ao governo, não mudou muito ao longo da história e, se levarmos em conta, o fato de que do começo do século 20, quando certas mulheres entraram na justiça pelo direito ao voto, até hoje, as mudanças na política institucional não foram muitas (temos apenas 10% de cargos paramentares composto por mulheres), então é evidente que a coisa vai mal. As mulheres continuam longe do poder, ao mesmo tempo, estão no mercado de trabalho e sempre segurando as barras econômicas e sociais mais variadas. Empoderam-se economicamente, acessam a universidade, sobem nas estatísticas acadêmicas, em muitos casos estamos superando a fantasmagoria opressiva do machismo, mas não mudam as condições em termos de política. A criação de um partido tem como fim entrar de cabeça na disputa por cargos, espaço, governo. A meu ver, feministas (e a maioria das feministas são mulheres e não homes) devem governar para que tenhamos direitos das mulheres (e das minorias com as quais as mulheres partilham uma história de opressão) como prioridade na política. Mas não apenas isso. O feminismo é outra forma de poder, é potência dialógica, participativa e solidária. Um poder diferente, um poder outro. Voltado ao outro, aos excluídos e, ao mesmo tempo, razoável e prático, voltado à construção de uma sociedade sem violência. Chamos isso de Revolução, porque o feminismo foi a única que vem dando certo. É hora de organizar essa Revolução na direção de um salto histórico. 

Como você definiria o #partidA?

A #partidA é um movimento que já está acontecendo. Nasce já provocando porque muitas pessoas acham absurda a ideia de um partido feminista, como sempre se pensou em termos aliás masculinistas, o feminismo um absurdo. É que o feminismo está por demais ligado à proibição vivida pelas mulheres de estarem na política. O feminismo sempre foi antagonista do patriarcado e por isso sempre incomodou. Estamos confrontando essa estupidez histórica. Estamos confrontando e ressignificando a ideia tradicional de partido. Por que o feminismo nunca foi, nem será, algo tradicional. Por isso, a #partidA é um movimento no sentido de um começo novo que estamos dando a nós mesmas e a toda a sociedade brasileira. Estamos em um momento precioso, em que cada participante é convidado a inventar a #partidA. Como movimento sua qualidade é o encontro em nome de uma democracia feminista, não uma democracia de fachada, mas uma democracia concreta em que cada participante dialoga, pensa, conversa e faz junto com os outros. A metodologia é o diálogo. Daí tomaremos decisões em conjunto. O afeto que rege a conversa é a alegria, porque ela é a força revolucionária, anti-fascista, aberta à singularidade e à diferença. Falo coisas mais teóricas pra quem se interessar no meu blog. A Carla Rodrigues, professora da UFRJ, também escreveu algo legal a partir do #partidA.

O que devem fazer as mulheres que estão interessadas em participar desse movimento ?
Devem escrever pra gente, pelo Facebook, pelo Twitter, por e-mail. Por enquanto, não temos nada oficial, porque queremos antes ter a nós mesmas. Eu recomendaria que as pessoas perguntassem pelas redes sociais, “onde está a #partidA? Ela vai nos achar. Podem entrar em contato com alguém do grupo, eu ou outras pessoas. Podem mandar uma mensagem informal que vamos nos apresentando e inventando juntas. Por fim, podem também mandar mensagem para: contato@marciatiburi.com.br que vamos inserindo nas conversas.

Fonte: ‘A Obscena Senhorita C’, blog de Carol Teixeira – http://bit.ly/1B6ICzh

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