As crianças do Glicério recriam e reencantam a metrópole

 
Não muito longe da Praça da Sé, às margens do rio Tamanduateí, a Baixada do Glicério é um microcosmo da metrópole paulistana. É a partir deste território, rico de etnias, culturas e afetos, que crianças de 0 a 12 anos estão recriando e reencantando a grande cidade, em função do Projeto Criança Fala na Comunidade – Escuta Glicério, da organização CriaCidade.

O objetivo do Projeto, que conta com o apoio de várias organizações e do Programa São Paulo Carinhosa, da Prefeitura de São Paulo, é muito simples, como destaca a socióloga Nayana Brettas, idealizadora do CriaCidade e coordenadora do Criança Fala.

“Trata-se de dar protagonismo à criança, através da escuta do que ela pensa, sente e deseja para a cidade onde mora”, explica Nayana, que trabalha há anos com política públicas na área da infância e juventude.

Formada em Ciências Sociais pela PUC-São Paulo e com mestrado em Sociologia da Infância pela Universidade do Minho, em Portugal, ela atuou por exemplo no projeto dos vídeos “Escutar as crianças” e “Escutar as crianças – Faça você mesmo”, realizados a partir da escuta de crianças do Distrito Federal.

Produzidos com a parceria da Secretaria da Criança do Distrito Federal e Organização Mundial para a Educação Pré-Escolar (Omep), os vídeos tiveram o apoio do Instituto C&A. O propósito foi ouvir as crianças, de modo a inserir sua visão na formulação de políticas públicas direcionadas à primeira infância no DF. Um dos resultados do trabalho foi o Plano Distrital pela Primeira Infância, já em vigor.

 
Mapeamento afetivo no Glicério 

A experiência de escuta das crianças foi ampliada no Projeto Criança Fala na Comunidade – Escuta Glicério. Com o apoio do arquiteto Rodrigo de Moura e outros profissionais, foi construída uma metodologia de escuta das crianças, visando o “mapeamento afetivo” do bairro. “O propósito era que as próprias crianças identificassem os locais e equipamentos públicos que elas consideram mais importantes para elas, e que também contribuíssem para a ressignificação dos espaços, com sugestões de melhorias, de como deveria ser a cidade onde vivem”, relata Rodrigo.

Na prática, seria portanto a inversão da lógica emprega tradicionalmente no desenho das cidades. “Ainda há uma visão impositiva no planejamento urbano, com a implantação do olhar do arquiteto ou planejador. Ouvir as crianças, sobre como deveria ser a cidade que não foi feita para elas, é dar outra perspectiva”, comenta o arquiteto.

 
 
Desenho de João Pedro, com seu mapa do Glicério. Foto: Juliana Rosa / Prosa e Fotografia.
 
Desses conceitos nasceram as várias etapas do Projeto Criança Fala na Comunidade – Escuta Glicério. As crianças foram convidadas, inicialmente, a participar como guias de “passeios brincantes”, percursos pelo bairro pensados para que elas pudessem expressar sua percepção sobre o lugar onde vivem e convivem. E sempre com a participação em brincadeiras, o lúdico como ferramenta de análise, crítica e proposição.

O passo seguinte, ressalta Rodrigo de Moura, foi outro convite, para que as crianças formulassem um mapa individual do Glicério. Por meio de desenhos, elas contaram o que apontam de mais significativo no bairro e o que elas gostariam de transformar. O viaduto que divide o Glicério em dois, os cortiços, as poucas áreas de diversão foram alguns elementos evidenciados pelas crianças, através de seus desenhos.

Em uma terceira etapa, as crianças participaram, então, de um trabalho coletivo de mapeamento. Nesse momento foram identificados pontos em comum nos diversos relatos apresentados. São os espaços, as referências que as crianças demonstraram ter de forma compartilhada em seu cotidiano.

 
 
 O Mapa Afetivo do Glicério, desenhado com base na escuta das crianças. Foto: Juliana Rosa / Prosa e Fotografia.
 
Entre outros, apareceram com destaque espaços como a rua Lins, conhecida como Vilinha, e do Duque, a escola do bairro. Mas também pontos como o próprio viaduto, a Igreja da Paz – onde são realizadas muitas atividades voltadas para os migrantes – e até a “Coxinha do Seu Valdomiro”, um quitute muito apreciado pelos moradores.

Com base no mapeamento, no (re)conhecimento sobre o lugar onde vivem, as crianças foram, também, convidadas ao exercício de redesenho, de requalificação do espaço urbano. Um dos resultados foi o “Brinquedão”, implantado coletivamente durante as ações do projeto. A Vilinha também foi reconfigurada, com o desenho no asfalto de linhas para jogo de amarelinha e outros, além de grafites que tornaram os muros mais coloridos.

Uma experiência coletiva, uma comunhão de afetos, a oportunidade para a expressão individual e compartilhada de sonhos e esperanças. O Projeto Criança Fala na Comunidade – Escuta Glicério foi determinante para um novo olhar da criança sobre a cidade e, segundo Nayana Brettas, terá continuidade com outras linhas de atuação.

 
“As crianças perceberam que é possível redesenhar o espaço onde vivem, é possível pensar locais mais interessantes para todos”, afirma Nayana, sintetizando aquele que, possivelmente, foi a principal consequência do projeto que tende a se expandir do Glicério para outros cantos, outras esquinas de convívio e troca.

Os passos do projeto foram documentados na publicação “O Glicério por suas crianças”, editada com apoio da Fundação Bernard van Leer, Unicef, Instituto C&A, Aldeias Infantis e SOS Brasil. Além de Nayana Brettas e Rodrigo de Moura, a equipe executora contou com a arquiteta e urbanista e fotógrafa Juliana Rosa, a pedagoga Estefânia Nazário, o pedagogo e psicopedagogo Beto Silva e a psicóloga Cristiane Lima. A publicação pode ser acessada no link:

 
A formação de lideranças locais, visando o empoderamento e o prosseguimento das ações, e o maior envolvimento das famílias são algumas das frentes previstas. Em discussão, igualmente, a formação de uma Rede de Crianças Transformadoras, voltada para o intercâmbio de percepções e experiências entre crianças moradoras de bairros com perfis sociais e econômicos distintos. Um maior envolvimento de universidades e pesquisadores, pelo fortalecimento conceitual e metodológico, é outro roteiro que pode ser trilhado.
 
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A mensagem de Thiffany: a cidade que ela sonha. Foto: Juliana Rosa / Prosa e Fotografia.
 
 “As crianças perceberam que é possível redesenhar o espaço onde vivem, é possível pensar locais mais interessantes para todos”, afirma Nayana, sintetizando aquele que, possivelmente, foi a principal consequência do projeto que tende a se expandir do Glicério para outros cantos, outras esquinas de convívio e troca.

Os passos do projeto foram documentados na publicação “O Glicério por suas crianças”, editada com apoio da Fundação Bernard van Leer, Unicef, Instituto C&A, Aldeias Infantis e SOS Brasil. Além de Nayana Brettas e Rodrigo de Moura, a equipe executora contou com a arquiteta e urbanista e fotógrafa Juliana Rosa, a pedagoga Estefânia Nazário, o pedagogo e psicopedagogo Beto Silva e a psicóloga Cristiane Lima. A publicação pode ser acessada neste link.

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Fonte: Juntos Pela Educação / Institutos Arcor e C&A.

 

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